Título: Blair reforça pressão sobre Lula e ouve outro não
Autor: Marin, Denise Chrispim
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/06/2007, Economia, p. B1

Sem apresentar melhora na oferta agrícola da União Européia (UE), o primeiro-ministro britânico, Tony Blair, telefonou ontem para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para pressioná-lo a aceitar abertura mais ampla do mercado industrial brasileiro como meio de salvar a Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC). A pressão deu-se um dia após o fracasso do G-4 (Estados Unidos, UE, Brasil e Índia) em alcançar um pré-acordo na rodada.

Em 20 minutos de conversa, Blair reiterou a Lula que o Brasil precisa derrubar a tarifa máxima de importação de bens industriais de 35% para 12,73%, corte equivalente ao do Coeficiente 20 da Fórmula Suíça, na mesma linha da ofensiva de americanos e europeus na reunião do G-4, em Potsdam, que levou brasileiros e indianos a deixarem a mesa e anunciarem o fiasco das negociações.

Segundo o porta-voz da Presidência, Marcelo Baumbach, Lula rebateu que não concordaria com esse nível de abertura nem mesmo com o acordo agrícola almejado pelo Brasil e seus aliados e defendeu que só um encontro de líderes, no qual as posições técnicas fossem substituídas por concessões políticas, salvará a rodada.

Blair argumentou que as 48 horas seguintes seriam decisivas para a rodada e contava com a atuação de Lula para impedir o fracasso total das negociações. Além de derrubar a tarifa máxima de 35% para 12,73%, esse coeficiente puxaria a tarifa média consolidada pelo Brasil para 11,74% e afetaria 3.437 dos 8.800 itens industriais.

A proposta brasileira para a abertura industrial, reafirmou Lula a Blair, continuará em torno do Coeficiente 30. Isso significaria a queda na tarifa máxima consolidada pelo Brasil na OMC para 16,15%. A tarifa média passaria a 14,68%. No total, 2.474 itens industriais seriam atingidos pela redução da proteção tarifária - cerca de mil menos que no Coeficiente 20.

Em Potsdam, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, acenara com um meio-termo - a possibilidade de o Brasil ampliar a abertura até o Coeficiente 25, se as concessões agrícolas chegassem a um nível razoável. Nesse caso, a tarifa máxima para o setor industrial seria de 14,58%. Mas os EUA deveriam concordar com um teto de US$ 15 bilhões por ano para os subsídios concedidos a agricultores e a UE teria de aceitar corte de mais de 70% nas tarifas de importação para o setor agrícola e a redução das exceções. Mas os EUA se encastelaram em US$ 17 bilhões e os europeus retrocederam ao corte de 54%. O Coeficiente 25 não voltou a ser sinalizado.

Ao tratar do assunto com Blair, Lula deixou claro que houve desequilíbrio entre as exigências e ofertas das economias mais ricas na etapa final de uma rodada que tem como alvo a eliminação de distorções no comércio agrícola mundial.

Ele esclareceu, ainda, a sua consciência de que americanos e europeus acomodaram seus interesses em uma aliança de última hora, que apontou as baterias para o mercado industrial brasileiro. De Belo Horizonte, onde esteve anteontem, Lula recebera informes de Amorim sobre os impasses em Potsdam.

Ao arrematar a conversa, o presidente disse a Blair que o Brasil continuará a contribuir para a conclusão das negociações. Mas ressaltou que a única saída é a melhoria das ofertas agrícolas da UE e dos EUA e a redução das expectativas de ambos em relação às concessões na área industrial.