Título: A defesa da Lei de Greve
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/06/2007, Notas e Informações, p. A3

Em audiência pública realizada na Comissão de Trabalho da Câmara, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, fez uma veemente defesa do projeto de lei que disciplina a paralisia no setor público e afirmou que o governo o enviará para o Congresso no início de agosto, independentemente do apoio ou da oposição das centrais sindicais. O encontro ocorreu sob forte tensão, pois os funcionários em greve das universidades federais e do Ministério da Cultura ocuparam quase todos os lugares disponíveis da platéia e por diversas vezes vaiaram o ministro. Atualmente, estão paradas dez categorias do Poder Executivo, num total de 95 mil servidores federais.

Em 2003, após a primeira grande greve na administração pública que teve de enfrentar, a de agentes e delegados da Polícia Federal, o presidente Lula prometeu enviar o projeto de regulamentação da greve do setor público ao Congresso. A medida é prevista pelo inciso VII do artigo 37 da Constituição, que concedeu o direito de greve ao funcionalismo público e determinou que seu exercício fosse disciplinado por lei complementar. Mas, para não ter a oposição dos servidores na disputa eleitoral de 2006, Lula somente cumpriu a promessa há um mês, com receio de que a crise gerada pelo motim dos controladores de tráfego aéreo se irradiasse para outros setores da administração pública.

Sob coordenação do Ministério do Planejamento, o projeto foi preparado pela Advocacia-Geral da União (AGU) e surpreendeu por sua qualidade e sensatez. Para evitar que greves sejam deflagradas por minorias de servidores e por líderes sem representatividade, ele exige que a paralisia tenha a aprovação de pelo menos 2/3 da categoria e impõe um quórum mínimo para a realização das assembléias gerais. Caso essas exigências não sejam obedecidas, a greve será considerada ilegal e os funcionários públicos que faltarem ao trabalho serão punidos com corte de ponto e sanções administrativas.

Com o objetivo de evitar que a população fique sem serviços essenciais, o projeto também obriga que 40% dos servidores de cada órgão permaneçam no trabalho durante as paralisações e permite ao governo solicitar à Justiça Federal a elevação desse porcentual, se houver necessidade. A inovação mais polêmica é a que permite a contratação de funcionários temporários para substituir os grevistas. Segundo Paulo Bernardo, a maior preocupação do projeto é manter a continuidade dos serviços essenciais, impedindo que a população seja prejudicada. ¿Greves do funcionalismo só trazem prejuízos ao povo¿, diz o ministro.

Evidentemente, as diferentes corporações do funcionalismo receberam o projeto com duras críticas. Mas Lula, que começou sua carreira no sindicalismo, imediatamente contra-atacou, anunciando que não faria concessões e afirmando que greves de mais de 30 dias sem corte de salário são férias. Mas havia resistências no interior do governo. Quando o projeto estava pronto para ser enviado ao Legislativo, o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, passou a criticá-lo abertamente. E, em seguida, o secretário de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Sérgio Mendonça, assinou um documento comprometendo-se a ¿negociar¿ com as centrais sindicais o texto preparado pela AGU.

Tratava-se de um despropósito, pois dessa negociação não pode sair qualquer acordo, uma vez que as centrais sindicais - uma das quais é controlada por servidores da administração direta - não admitem qualquer limitação ao direito de greve. Além disso, é inadmissível que um burocrata do segundo escalão ignore o que vinha sendo dito tanto por Lula quanto pelo ministro do Planejamento a respeito de uma matéria sabidamente polêmica.

Foi para tentar restabelecer o princípio da hierarquia e evitar a desmoralização do governo, no momento em que dez categorias do funcionalismo estão paradas, que o ministro do Planejamento fez uma firme defesa do projeto que disciplina a greve do setor público e anunciou que o presidente Lula o enviará em agosto ao Congresso, onde tem ampla base de apoio parlamentar, independentemente das críticas das centrais sindicais. Resta agora esperar que nenhum novo pretexto impeça o governo de cumprir a promessa.