Título: Após encontro com Lula, Renan ganha apoio em massa do governo
Autor: Monteiro, Tânia e Nossa, Leonencio
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/06/2007, Nacional, p. A4

Foi dia de dirigir afagos ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Pouco mais de 24 horas depois de Renan pedir socorro ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cobrando a fatura de seu apoio ao governo, a defesa pública não tardou. Ontem, na cerimônia de recondução do procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, no Palácio do Planalto, Lula atacou o comportamento da Polícia Federal e do Ministério Público, pediu mais cautela nas apurações, sob o argumento de que investigados são ¿execrados¿ antes do julgamento, e disse que todos são inocentes até prova em contrário.

Ao lado de Renan, que é acusado de ter contas pessoais pagas por um lobista da Construtora Mendes Júnior, o presidente afirmou que ninguém pode ser condenado sem provas. ¿Uma coisa me inquieta como cidadão, me inquieta no comportamento da Polícia Federal e no comportamento do Ministério Público: é muitas vezes não termos o cuidado de evitar que pessoas sejam execradas publicamente, antes de serem julgadas¿, afirmou.

Mesmo sem ter o nome citado, Renan abriu um sorriso e deu dois tapinhas de agradecimento nas costas do presidente. Ao chegar ao Congresso, o senador tinha a fisionomia mais aliviada. ¿Lula é um grande amigo¿, disse.

Diante de uma platéia formada, em sua maioria, por ministros e integrantes do Ministério Público, o presidente afirmou que a democracia precisa de ¿instituições fortes¿ para não ser abalada por ¿tremores das intempéries políticas¿ no País. ¿E não há nada pior para a democracia do que alguém ser condenado sem ter cometido um crime. É tão grave quanto alguém ser absolvido tendo cometido um crime¿, comentou.

¿Sempre parto do pressuposto de que a democracia garante que todos, sem distinção, são inocentes até prova em contrário¿, prosseguiu. ¿Portanto, todos precisam ter um julgamento feito com a maior lisura possível, para que não se cometa nenhum erro de omissão e nenhum exagero, em qualquer uma das nossas instituições.¿

VAVÁ

Dias depois de ver seu irmão mais velhos, Genival Inácio da Silva, o Vavá, indiciado em inquérito pela PF por tráfico de influência e exploração de prestígio - embora o Ministério Público não tenha oferecido denúncia contra ele -, Lula pediu ¿equilíbrio¿ para que se faça ¿a boa, sensata e madura¿ investigação. ¿Doa a quem doer¿, acrescentou. Ele repetiu, ainda, o argumento usado quando Vavá foi acusado de fazer lobby na Esplanada dos Ministérios: disse que todos devem ter a chance de provar sua inocência antes de serem condenados.

O ministro da Justiça, Tarso Genro, seguiu o mesmo roteiro de defesa traçado pelo presidente. ¿O que eu quero para o País e para o bom funcionamento das instituições é que Renan seja inocente¿, disse ele, quatro horas depois do discurso de Lula. ¿É isso que todos nós queremos e que o povo brasileiro quer.¿

A chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, adotou tom semelhante. ¿Acho que as palavras do presidente Lula se aplicam a todos os brasileiros: ninguém é culpado até que se prove e o princípio dos direitos individuais é absolutamente crucial numa democracia¿, afirmou Dilma.

Em conversas reservadas, o presidente e alguns de seus auxiliares diretos afirmam que Renan deveria se licenciar do cargo até o término das investigações, para sair do fogo cruzado. Avaliam que essa atitude seria mais adequada e não prejudicaria o governo nas votações do Congresso. Renan resiste. Se aceitasse a sugestão, o comando do Senado seria assumido pelo petista Tião Viana (AC), atual vice-presidente da Casa.

Tarso disse esperar que a crise termine rapidamente para que o Senado retome suas atividades. Em tom cauteloso, o ministro tentou pôr panos quentes no conflito. ¿Nós queremos que tudo termine bem, tudo se pacifique e, independentemente de qual seja a solução, o Senado volte a funcionar com estabilidade e tranqüilidade.¿

Apesar das críticas ao Ministério Público e à PF, Lula elogiou a atuação do procurador-geral nos últimos dois anos: ¿Tenho convicção de que você é um homem que pode continuar a dirigir o Ministério Público, para que ele tenha cada vez mais atuação na investigação, no combate aos erros da administração pública, no combate à corrupção.¿ Foi Souza que apresentou denúncia contra os 40 acusados no caso do mensalão, dizendo que havia uma ¿quadrilha¿ instalada no governo.

Em entrevista depois, Souza disse que não se sentiu ¿intimidado¿ nem ¿constrangido¿ com a presença de Renan na cerimônia e negou ter visto o senador dar tapinhas nas costas de Lula. ¿Constrangimento não faz parte de quem exerce um cargo dessa envergadura¿, argumentou.

Ele frisou que nunca teve problemas em decorrência de pressões externas. ¿Uma autoridade pública não tem de sentir constrangimento em nada¿, reforçou. Anteontem, depois de sua sabatina no Senado, o procurador afirmara que não encontrou indícios de crime no caso Renan e, por isso, não pediria investigação ao Supremo Tribunal Federal (STF).

CONTRAMÃO

Na contramão de Tarso e Dilma, o ministro do Trabalho e Emprego, Carlos Lupi, se alinhou ao líder do PDT no Senado, Jefferson Péres (AM), que tem defendido o aprofundamento das investigações contra Renan. Lupi ressaltou que o partido não ¿coloca mordaça em ninguém¿ e não abre mão da ética. ¿Nossas bancadas têm independência. Os senadores foram eleitos pelo povo, têm independência e autonomia de avaliar, encarar e exercer as suas funções plenamente¿, disse o ministro, ao participar de uma solenidade em Betim, na região metropolitana de Belo Horizonte.