Título: Retomada de Angra 3
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Fonte: O Estado de São Paulo, 27/06/2007, Notas & Informações, p. A3
Para justificar a decisão do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), que aprovou a retomada da construção da Usina Nuclear Angra 3, o ministro interino de Minas e Energia, Nelson Hubner, usou dois argumentos: Angra 3 é a alternativa de menor custo para o País enfrentar o problema da escassez de energia e a que oferece as melhores condições, inclusive ambientais. O governo vinha há algum tempo considerando a possibilidade de retomar essas obras, paralisadas há 21 anos, mas as discussões estavam sendo conduzidas com muita cautela, porque a usina nuclear até recentemente era considerada perigosa e cara.
Foi a crescente preocupação com o lançamento de dióxido de carbono na atmosfera que recolocou a alternativa nuclear em discussão. A geração de energia com a queima de derivados de petróleo ou carvão produz centenas de vezes mais dióxido de carbono por quilowatt-hora (kWh) do que a geração nuclear. Com relação a custos, estudos realizados pelo governo no ano passado indicaram que a tarifa de Angra 3 ficará em R$ 140 por megawatt-hora (MWh), preço competitivo se comparado com o da energia gerada por usinas térmicas que empregam outras fontes, como o gás natural.
A decisão do CNPE teve 9 votos a favor e apenas 1 contra, o do representante do Ministério do Meio Ambiente. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, é contra a expansão da geração nuclear porque, segundo ela, o Brasil tem alternativas renováveis de energia e, no resto do mundo, não se registram investimentos em energia nuclear nos últimos 15 anos.
De fato, o Brasil dispõe de alternativas de energia renovável, mas algumas das mais importantes delas ainda não podem ser utilizadas porque o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), vinculado ao ministério do qual Marina Silva é titular, vem retardando a concessão das licenças para a execução das obras. O caso mais notório é o das usinas programadas para o Rio Madeira, cuja construção é considerada indispensável para afastar o risco de ocorrência de novo apagão nos próximos anos.
Quanto a investimentos em energia nuclear no exterior, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) registra, no momento, a construção de mais de duas dezenas de usinas em dez países, que viram nessa forma de geração de energia uma alternativa às usinas térmicas que utilizam derivados de petróleo, cujo preço disparou nos últimos anos.
O início das obras de Angra 3, porém, ainda depende da solução de alguns problemas. O primeiro deles é a concessão, também neste caso, da licença ambiental pelo Ibama. O ministro interino de Minas e Energia acredita que, pela fato de Angra 3 ficar na área onde estão instaladas as outras usinas nucleares em operação no País, não haverá grandes dificuldades para a concessão da licença. O processo de licenciamento já tramita no Ibama.
Outro problema é a definição das fontes de recursos para as obras, que estarão concluídas num prazo de cinco anos e meio e estão orçadas em R$ 7,2 bilhões.
Por fim, o governo tem de encontrar uma solução definitiva para os rejeitos radioativos das usinas nucleares. Os rejeitos de Angra 1 e 2 estão em depósitos provisórios na área das usinas. O volume de rejeitos a serem gerados por Angra 3 dificultará a utilização desse método. Além disso, o governo pode ser forçado a encontrar a solução antes de concluir Angra 3, pois o Ministério Público Federal entrou com uma ação pública contra os órgãos oficiais ligados à área nuclear exigindo que no orçamento do próximo ano sejam incluídos recursos para a construção e instalação de depósitos definitivos para os resíduos radioativos.
A conclusão de Angra 3, com potência de 1.353 MW, como Angra 2, permitirá a utilização de equipamentos comprados ao custo de US$ 750 milhões e que estão armazenados em Angra dos Reis. Só na conservação desses equipamentos são gastos, anualmente, US$ 20 milhões. O funcionamento da nova usina nuclear tornará viável o enriquecimento de urânio em escala industrial no País. O Brasil já domina o ciclo completo de enriquecimento do urânio, mas ainda não fazia isso em escala industrial por falta de demanda.