Título: Flexibilização da meta
Autor: Ming, Celso
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/06/2007, Economia, p. B2

O Conselho Monetário Nacional (CMN) mudou ontem o sistema de metas de inflação. Passou a ser adotado o vigente na Nova Zelândia, Austrália e Israel, que elimina o centro da meta e permite que o Banco Central trabalhe com toda a banda da meta de inflação situada entre os intervalos de tolerância. Assim, a meta de inflação de 2008 e de 2009 passou a ser a faixa entre 2,5% e 6,5%.

Mas a maneira como foi divulgada essa mudança passou a impressão inicial de que o governo se entregara a um inédito contorcionismo monetário.

Na entrevista concedida logo após a reunião, os três membros do CMN (o ministro da Fazenda, o ministro do Planejamento e o presidente do Banco Central) disseram que o Banco Central estava autorizado a cumprir uma meta de inflação abaixo do centro da meta, fixado em 4,5% para 2009.

Nesse sentido, ficaria neutralizada a acusação reiteradamente feita pelo senador Aloizio Mercadante (PT-SP) de que o Banco Central trabalha com uma 'meta oculta', na medida em que há dois anos entrega uma inflação mais baixa do que a prevista no centro da meta. Para uma meta de 4,5% com 2 pontos porcentuais de escape tanto para cima como para baixo, a inflação foi de 3,14% em 2006 e deve desembocar em alguma coisa em torno de 3,5% em 2007.

Além disso, o Banco Central ficou autorizado a buscar uma inflação abaixo do centro matemático dessa meta. Os tais 4,5% para 2009 só foram explicitados na entrevista como centro da meta por que, à última hora, os juristas consultados lembraram os membros do CMN que a lei exige a definição de um centro.

A fixação da meta de inflação para 2009 foi feita agora porque a política de juros não é uma lancha que faz uma curva instantânea; é um transatlântico que tem de ser comandado com antecedência, porque os juros só fazem efeito em seis ou nove meses. Ou seja, na calibragem dos juros já é preciso levar em conta a inflação de 2008 e de 2009.

Antes da mudança ontem adotada, eram duas as propostas em discussão. O ministro do Planejamento e o presidente do Banco Central defendiam uma meta mais apertada, de 4%. O ministro da Fazenda pretendia manter 4,5%, que, em princípio, ajudaria a derrubar os juros mais depressa. Na semana passada, em entrevista ao jornal Valor, o presidente Lula pareceu favorecer a posição da Fazenda.

O que não foi dito na entrevista nem depois é que, nos próximos meses, o Banco Central deve operar a política monetária em um ambiente de juros provavelmente mais favorável. Se for confirmado nos próximos 12 meses o grau de investimento para a dívida brasileira, será inevitável a queda mais rápida nos juros básicos (Selic), tanto porque a fartura de dólares tenderá a manter o real valorizado, o que tende a derrubar os preços, como porque o mercado deverá trabalhar com juros futuros mais baixos.

Do ponto de vista prático, uma flexibilidade maior para que o Banco Central opere a política monetária reforça as apostas de que o Copom continuará cortando os juros em meio ponto por vez, pelo menos nas próximas três reuniões do Copom.