Título: Conselho de ética adia decisão para terça
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Fonte: O Estado de São Paulo, 16/06/2007, Nacional, p. A4

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e seus aliados foram derrotados ontem no Conselho de Ética, pela terceira vez, na tentativa de enterrar logo o processo aberto para investigar a suspeita de quebra de decoro parlamentar contra ele por, supostamente, ter despesas pessoais pagas com dinheiro de um lobista da empreiteira Mendes Júnior. Antes, Renan havia tentado evitar a abertura - pedida pelo PSOL - do processo. Na quarta-feira passada, apesar da pressão dos aliados, o presidente do conselho, senador Sibá Machado (PT-AC), teve de abrir ¿vista coletiva¿ dos documentos a todos os senadores e adiar a reunião para ontem de manhã.

Ontem, temendo ser alvo de uma nova investigação - por ter supostamente apresentado notas frias para justificar seus rendimentos agropecuários -, Renan manobrou para evitar que a denúncia também venha a ser apurada no Conselho de Ética. Ele propôs, e foi acatada, a sugestão de submeter a uma perícia os recibos sobre a venda do gado de suas fazendas, antes da votação - na próxima terça-feira - do parecer em que o relator Epitácio Cafeteira (PTB-MA) manda arquivar o processo.

Ainda por sugestão de Renan - transmitida por telefone ao líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR) - ficou acertado que o conselho ouvirá dois depoimentos na tarde de segunda-feira: o do lobista da Mendes Júnior Cláudio Gontijo e o do advogado da jornalista Mônica Veloso, Pedro Calmon. O advogado decidirá hoje se comparecerá ou não, após ouvir a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e conhecer os motivos que levaram o conselho a requerer sua presença.

De acordo com reportagem da revista Veja, a jornalista, com quem Renan tem uma filha de 3 anos, receberia das mãos de Gontijo, na sede da empreiteira, dinheiro para pagar seu aluguel, de R$ 4 mil, e os R$ 8 mil da pensão alimentícia.

RECIBOS

Renan mandou para o Conselho de Ética e para a Corregedoria do Senado recibos que, segundo ele, comprovariam o recebimento de recursos suficientes para bancar essas despesas. A origem do dinheiro, que seria a venda de gado, foi posta em suspeita, após o Jornal Nacional, da TV Globo, localizar ¿compradores¿ que negaram a transação.

A estratégia encabeçada por Renan Calheiros surpreendeu seus próprios aliados. Eles chegaram à Casa devidamente instruídos para aprovar o parecer de Cafeteira. Para o senador Gilvan Borges (PMDB-AP), seria esse o melhor procedimento ¿para evitar que a situação de Renan se complique¿.

Wellington Salgado (PMDB-MG) alegou que adiar a votação seria ¿transferir o sangramento do presidente para a terça-feira¿. ¿Ele tem todas as notas para provar sua inocência¿, insistiu.

A maior resistência, porém, partiu do relator Epitácio Cafeteira, que ameaçou entregar o cargo à líder do PT, Ideli Salvatti (SC), para não ficar ¿desmoralizado¿. ¿Se eu aceitasse que meu relatório não seja votado hoje, estaria dizendo ao povo do Maranhão: tire-me do Senado, mande-me de volta, eu não sou juiz, sou advogado¿, afirmou. Com a voz embargada, algumas vezes dando a impressão de que iria chorar, lembrou que ainda estava se recuperando, ¿depois de ter sido conduzido nu, em um avião, para ser tratado em São Paulo¿. Parecia irredutível, rejeitando até o apelo que Renan lhe fez por telefone, sob a alegação de que obedecia ao Regimento da Casa.

O líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), endossou a idéia da renúncia. ¿Aqui não é jogo da oposição contra governo, se votarmos agora, o relatório estará eivado de desconfiança e o senador Renan Calheiros não poderá se defender¿, argumentou.

Ao final, após falar ao telefone, Cafeteira disse que iria mudar de idéia para atender ¿à pessoa que me salvou a vida¿. ¿Vou concordar em homenagem à minha mulher com quem tenho a melhor convivência do mundo, mas não mudo uma linha do meu relatório¿, frisou. Explicou em seguida que sua mulher, Maria Isabel, tinha recebido o pedido do próprio Renan Calheiros. A assessoria do presidente do Senado não confirma a informação.

Principal intermediário de Renan no conselho, o senador Jucá atribuiu as mudanças de planos à ¿conjuntura¿ dos debates sobre a origem do dinheiro depositado nas contas do presidente do Senado. ¿O quadro mudou e o presidente não quer deixar dúvidas sobre a sua situação¿, justificou. Ao final da reunião do conselho, o líder e outros parlamentares da base aliada do governo foram se encontrar com Renan Calheiros, na residência oficial do Senado.