Título: Pensão de Lamarca continua causando polêmica no País
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Fonte: O Estado de São Paulo, 16/06/2007, Nacional, p. A21

Trabalho da Comissão de Anistia irrita militares, mas ministro vê avanço

Ao tocar pontos nevrálgicos da história do País, a Comissão da Anistia reabriu feridas que prometem causar muita polêmica. Após decidir inúmeros casos, a decisão tomada esta semana de pagar pensão de general-de-brigada - R$ 12.125 - à viúva do guerrilheiro Carlos Lamarca, além de R$ 300 mil de indenização à família, não incomodou os militares tanto pelos valores. A questão, para eles, é outra: consideram Lamarca o maior ícone da deserção. Mas vem por aí mais gasolina na fogueira - já está na fila a discussão da anistia de Cabo Anselmo. Para a velha esquerda, ele sim é traidor.

A decisão referenda sentença do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que restabeleceu pensão correspondente à patente de coronel, perdida no fim da década de 60, quando Lamarca desertou do quartel de Quitaúna (SP), levando 63 fuzis FAL, metralhadoras e munição. A viúva, Maria Pavan, recorreu com base no regimento militar, ,que prevê proventos de uma graduação acima, por ocasião de aposentadoria. Vem daí a pensão de general-de-brigada.

O ministro da Justiça, Tarso Genro, a quem a Comissão de Anistia responde, considerou o fato como um marco na democracia. ¿Não temos mais o choque político vivido entre 1964 e 1988, não vivemos mais o contexto de uma Guerra Fria que opunha socialismo revolucionário e capitalismo imperialista¿, afirmou. Lamarca, que militava na Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), foi morto em 1971, no sertão da Bahia.

REAÇÃO

Os militares querem a história contada de outra maneira. Ontem, o presidente do Clube Militar, general da reserva Gilberto Barbosa de Figueiredo, classificou a aprovação do benefício como ¿mais uma tentativa de revanchismo e esperteza¿. Chamou Lamarca de ¿falso herói¿ e ¿desertor¿ e foi além: ¿Mais uma vez o inconformismo e o revanchismo raivoso da esquerda, reminiscente da chamada luta armada e o terrorismo dos anos 70, volta a se manifestar.¿

Apesar da reação, o presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abrão Pires Júnior, considera o seu trabalho como um ¿instrumento de estabilidade política¿. ¿Estamos levando a cabo um acerto democrático realizado no período da transição¿, opinou, em entrevista ao Estado publicada ontem. Para ele, ¿a abertura dos arquivos reforça a democracia¿.

Dos 58 mil pedidos de anistia apresentados desde 2001, cerca de metade foi julgada. Um deles, também bombástico, está na fila. É o pedido de anistia política de Cabo Anselmo, líder do motim dos marinheiros, tido como um dos responsáveis pela queda do presidente João Goulart e pela dispersão de várias organizações de esquerda.

Abrão defende o trabalho: ¿Todas as pessoas que tenham clareza têm a noção da importância de que a história venha à luz e os fatos sejam contados como realmente ocorreram.¿