Título: Medo de escutas emudece telefones de Brasília
Autor: Macedo, Fausto e Brandt, Ricardo
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/06/2007, Nacional, p. A10

O medo de contar segredos tomou conta de políticos e empresários de Brasília. A revelação de grampos de operações da Polícia Federal tem levado até os que aparentemente nada têm a esconder a usar truques e artifícios tecnológicos para fugir do Guardião da PF - o sistema que faz as interceptações. Parlamentares contam como se defendem, mas não querem, por motivos óbvios, ter os nomes revelados.

Um deputado tem usado cinco chips de celular e duas linhas, uma de Brasília e outra da Bahia, para fazer contatos políticos. Outro aderiu ao MSN - sistema de comunicação via computador -, e instalou um programa que criptografa os diálogos. Há os que optaram por dar marcha à ré e deixaram os celulares de lado. Conversas, garantem, só tête-à-tête.

Advogados engrossam a lista dos que prometem dar prejuízo às operadoras de telefonia celular. Um deles, recém-contratado por policiais federais investigados, combinou uma corrida de 10 quilômetros no Parque da Cidade para dar informações a um repórter.

Um político do PT conta que a maioria dos deputados e senadores tem fugido do celular ¿como o diabo da cruz¿. Ele próprio tem três e quase não os usa. Até a divulgação dos grampos, seus celulares não paravam de tocar. Na semana passada, ao receber o Estado para uma conversa, não recebeu nenhuma ligação, apesar de os três estarem ligados.

Profissionais da área de gestão de crise de imagem também reforçaram a cautela. Um deles só troca ligações com seus clientes pelo Skype, sistema de telefonia via internet que, acredita-se, a PF ainda não tem condições de grampear efetivamente.

A escuta telefônica sempre foi eficaz contra o crime organizado. O problema é a linha tênue entre combate ao crime e invasão da privacidade do cidadão comum. Para parlamentares, a PF mostrou eficiência com os recentes grampos. Mas há temor de que sejam usados para perseguição política, como fez o Serviço Nacional de Informação (SNI) na ditadura.

Em 1983, as escutas atingiram até o presidente Tancredo Neves, na época governador de Minas. Tancredo fez varredura no Palácio das Mangabeiras e descobriu o grampo. Decidiu, então, instalar um orelhão e só falava pelo telefone do palácio quando queria intrigar um adversário.