Título: Lista flexível complica financiamento
Autor: Leal, Luciana Nunes
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/06/2007, Nacional, p. A15

Especialista avalia que, sem sistema fechado, eleição não pode ser custeada apenas com recursos da União

A forte reação contra a idéia de um sistema de votação por meio de lista fechada levou os deputados a buscar uma proposta alternativa, que deverá alterar também outro ponto da reforma política: o financiamento público exclusivo de campanha. Na sexta-feira, muitos deputados reconheciam que a lista flexível, em que o eleitor votará no partido, mas também poderá escolher um candidato individualmente, é incompatível com o financiamento público exclusivo.

¿Lista flexível com financiamento público exclusivo é um desastre¿, avaliou o cientista político Jairo Nicolau, pesquisador do Instituto Universitário de Pesquisa do Rio de Janeiro (Iuperj), da Universidade Cândido Mendes, quando falou a um grupo de deputados, em reunião na liderança do PMDB na Câmara, na tarde da última quinta-feira.

¿Diz-se que a lista será flexível, mas a lei proibirá que os candidatos façam campanhas individuais. É impossível. Como é que vai proibir um candidato de fazer campanha para si próprio? Isso não vai acontecer. Com a lista flexível, o dinheiro público vai acabar sendo usado para campanhas individuais¿, disse o cientista político.

A proposta de financiamento público exclusivo que está na reforma política proíbe qualquer doação de empresas ou indivíduos para candidatos. As campanhas passariam a ser financiadas pela União, na base de um valor equivalente a R$ 7 por eleitor.

O valor total obtido seria então dividido entre os partidos, na proporção da representação na Câmara, e os recursos seriam repassados diretamente às direções partidárias.

Na tarde de sexta-feira, as dúvidas continuavam. ¿Senti uma grande dissonância entre os deputados, eles estão perdidos¿, resumiu Nicolau, que se reuniu com vários parlamentares durante todo o dia. Ouviu todo tipo de sugestão, das mais serenas às mais estapafúrdias. Segundo ele, ¿inventaram¿ mais sistemas eleitorais do que todos os que existem no mundo, que são 12 ou 13 modelos diferentes.

¿Me parece que o tema da reforma política sempre foi de especialistas, de uma ou duas dúzias de parlamentares que se dedicaram a refletir sobre isso. Os projetos expressavam um pouco a preferência dessas lideranças e ficava um debate entre poucos deputados, editorialistas, repórteres, especialistas. Quando finalmente houve um projeto sistematizado, do deputado Ronaldo Caiado, e ganhou o plenário, apareceram as resistências¿, observou o professor.

AUDITORIA

¿O que estou vendo é um grande interesse dos políticos pelo financiamento público exclusivo. No Brasil, o que se quer é estatizar a campanha e dar o dinheiro direto aos partidos. Em que isso vai melhorar a campanha, principalmente quando se fala em lista flexível?¿, indagou Nicolau. Para o cientista político, mais eficaz seria um modelo de financiamento que tornasse mais rigorosas as punições para os candidatos que infringirem a lei e também a adoção de um sistema de sorteio para fazer auditorias nas contas de alguns candidatos.

¿Em vez dessa prestação de contas de hoje, em que se contabiliza um lanche de R$ 7,90, mas não se sabe quanto foi gasto no total de lanches de toda a campanha, os candidatos que fossem sorteados teriam uma auditoria completa nas contas¿, disse ele. ¿É como o jogador que é sorteado para exame antidoping, como os municípios que são sorteados para auditorias do Tribunal de Contas da União (TCU), como os pesquisadores que recebem bolsa e precisam prestar contas até de uma caneta.¿

Outra sugestão dele é a proibição de contribuição de empresas privadas - as públicas já não podem doar. ¿O sistema não vai melhorar com financiamento público exclusivo. Mas, para alguns políticos, é uma maravilha¿, sustentou o pesquisador.