Título: Chile recua e mantém apoio a Lula em Doha
Autor: Marin, Denise Chrispim
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/06/2007, Economia, p. B5

País reconsidera posição a favor de corte de 60% nas tarifas de importação de bens industriais

O Chile recuou ontem de sua decisão de contrariar as posições do Brasil na Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC) e buscou um novo alinhamento com o País. Essa mudança foi informada pela própria presidente chilena, Michelle Bachelet, ao seu colega brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, durante encontro privado pela manhã. Horas depois, nos seus discursos durante a 33ª Reunião de Cúpula do Mercosul, Bachelet confirmou o recuo.

Lula aproveitou para dizer que o risco de fracasso das negociações na OMC reforça o 'caráter estratégico do Mercosul', como instrumento de inserção dos seus membros aos fluxos de comércio e de investimentos internacionais.

No início da semana, Chile, México, Colômbia e Costa Rica, além de países asiáticos, formaram um novo agrupamento na OMC e propuseram um corte de 60% nas tarifas de importação de bens industriais. Boa parte desses países, como o Chile, é sócia do Brasil no G-20, e está ciente das posições mais conservadoras de Brasília no capítulo industrial. A movimentação desse novo grupo causou mal-estar no governo brasileiro, especialmente ao Itamaraty.

'Meu país, como membro associado do Mercosul, dá a maior importância às negociações da Rodada Doha e expressa todo seu apoio às gestões realizadas pelo Brasil, como representante do G-20', declarou Bachelet, referindo-se à frente de países em desenvolvimento que negocia em conjunto apenas o capítulo agrícola da Rodada.

Segundo o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, o chanceler do Chile, Alejandro Foxley, foi igualmente claro ao apoiar as posições brasileiras na Rodada, durante o encontro entre Lula e Bachelet.

Ambos já haviam conversado por telefone, na segunda-feira, sobre o constrangimento gerado no governo brasileiro pela criação do novo grupo e por sua posição numa matéria delicada ao Brasil e outras economias em desenvolvimento. 'Ouvi do chanceler chileno a reiteração da decisão de apoiar os esforços e de trabalhar com o Brasil na OMC', afirmou Amorim, referindo-se à conversa de ontem. 'Mas tudo tem de ser traduzido em uma dinâmica genebrina', completou.

A oferta brasileira, que será formalizada em caso de concessões substanciais dos Estados Unidos e da União Européia na área agrícola, equivale a um corte de 50% nas tarifas industriais. Essa oferta reduz pela metade o número de itens industriais atingidos pela derrubada de tarifas de importação, em comparação com o corte de 60% proposto pelo novo grupo.

Amorim preferiu não especular com a imprensa sobre as razões da formação desse novo agrupamento. Atribuiu a iniciativa aos 'mistérios de Genebra', onde está a sede da OMC.

Diplomatas brasileiros explicam que o corte de 60% seria como um 'corte em água'. Mas, se for aplicado a todas as economias em desenvolvimento da OMC, entre as quais o Brasil, haveria um 'corte na carne' porque esses países aplicam tarifas maiores. Em comparação com a atual oferta brasileira, o dobro dos itens do setor industrial seria atingido pelo corte de tarifas.