Título: Com apoio do governo, empresas do País ampliam atuação internacional
Autor: Otta, Lu Aiko
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/07/2007, Economia, p. B1

Multinacionais brasileiras devem investir este ano US$ 10 bilhões lá fora e governo Lula prepara política de ajuda

Se um militante de esquerda entrasse em coma em 1970 e acordasse hoje, levaria um susto. O Brasil é governado por um ex-operário chamado Luiz Inácio Lula da Silva e Franklin Martins, um dos seqüestradores do embaixador americano Charles Elbrick, é ministro. O País também não deve mais um tostão ao Fundo Monetário Internacional (FMI).

Aliás, praticamente não tem mais dívida externa, pois as reservas internacionais, que estavam em US$ 146,1 bilhões na sexta-feira, já equivalem a toda a dívida externa de médio e longo prazos. Pelo dado mais recente, referente a abril, a dívida era de US$ 145,4 bilhões.

Como se não bastasse, pipocam multinacionais brasileiras pelo mundo inteiro e o governo prepara uma política específica para apoiar iniciativas desse tipo. Nos anos 70, as empresas estrangeiras que atuavam no Brasil eram apontadas pela esquerda como símbolos de dominação e exploração do País. Agora, o setor privado atua na mão inversa. Exemplos recentes são a compra da americana Swift pela brasileira Friboi, um negócio de US$ 1,4 bilhão que criou a maior exportadora mundial de carne bovina. A Vale do Rio Doce comprou no ano passado a mineradora canadense Inco por US$ 18 bilhões.

Este ano, as empresas brasileiras deverão enviar US$ 10 bilhões ao exterior para investimentos diretos, segundo estimativa do Banco Central. Será bem menos do que em 2006, quando foram enviados US$ 28,2 bilhões, um número inflado por causa da aquisição da Inco. Ainda assim, é um novo nível de investimentos no exterior. 'O número de empresas grandes e médias que investem lá fora está aumentando', afirma o professor Luiz Carlos Carvalho, da Fundação Dom Cabral.

Segundo o chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Altamir Lopes, são várias as razões que levam as empresas brasileiras a investir lá fora: proximidade com o cliente ou com a matéria-prima, juros mais baixos e prazos mais longos no financiamento. Há ainda outro fator: ao estruturar-se em bases globais, as empresas brasileiras ficam menos vulneráveis a crises financeiras internas ou externas.

A esses motivos, o professor Luiz Carlos Carvalho acrescenta uma razão de fundo: algumas empresas brasileiras estão ficando grandes demais para o mercado nacional. 'Elas precisam crescer para ter ganho de escala.' Ele cita como exemplo a Vale. 'Se ela ficasse só no mercado brasileiro, não teria porte para enfrentar suas concorrentes mundiais e acabaria sendo comprada por alguma delas.'

O diretor-executivo de Assuntos Corporativos e de Energia da Vale do Rio Doce, Tito Martins, explica que a empresa investe no exterior em busca de novas reservas minerais e para diversificar seu portfólio de modo que não fique concentrada só em minério de ferro. Mas há outra razão: a busca por capitais baratos.

A mineração é um negócio que exige investimentos de longo prazo e em grandes volumes. Por isso, as grandes empresas do setor competem por capitais no mundo inteiro. Quanto maior o porte da empresa, mais diversificado for seu portfólio e mais distribuídas geograficamente forem suas bases de produção, melhores são suas condições de obter empréstimos para continuar se expandindo. A Vale pretende investir US$ 2 bilhões no exterior este ano.

O Grupo Gerdau, que no ranking elaborado pela Fundação Dom Cabral aparece como a empresa mais internacionalizada do País, também aponta o crescimento estratégico e a diluição dos riscos como principais razões para investir no exterior. São causas diferentes das que motivaram o primeiro negócio internacional da empresa, em 1980, com a compra da uruguaia Laisa. Nesse caso, pesou a proximidade geográfica.

O principal destino dos investimentos internacionais da Gerdau são os Estados Unidos, onde a empresa já adquiriu quatro companhias e se fundiu com uma quinta. Os principais atrativos são o tamanho do mercado, as perspectivas de crescimento e o ambiente de negócios estável. Mais recentemente, a Gerdau comprou siderúrgicas na Venezuela, na República Dominicana e na Índia.

O movimento das empresas brasileiras rumo ao mercado internacional é positivo, avalia Luiz Carlos Carvalho, pois significa que o País está descobrindo a internacionalização - uma estratégia que impulsionou o crescimento dos EUA e da Europa. 'O Brasil sempre teve uma postura muito insular, uma preocupação voltada para o mercado interno', diz Carvalho.

Agora, as empresas começam a mudar de estratégia. Para Carvalho, a melhora do ambiente macroeconômico nacional e internacional ajuda. O dólar barato também contribui para ampliar investimentos externos.