Título: Caminhos para o futuro
Autor: Glogowsky, Martin
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/07/2007, Economia, p. B2

O Brasil vive um momento econômico sem paralelo nas últimas décadas. A demanda por produtos de empresas dos mais variados segmentos surpreende os fabricantes. O fenômeno é provocado pela ampliação do crédito e pelo aumento dos prazos de pagamento. Os investimentos em bens de capital também evoluíram, o que demonstra a predisposição do empresariado para elevar a oferta. O mercado como um todo já revê as previsões de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) para este ano. Algumas instituições apostam numa taxa de evolução de até 5%, em relação a 2006. Na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), o bom momento vivido pela economia nacional foi traduzido por uma queda mais acentuada da taxa básica de juros. A ampliação da arrecadação de impostos, gerada pelo aquecimento da economia, aliada à redução da Selic, já permite projetar um déficit nominal das contas públicas perto de zero. Em 2008 há uma enorme possibilidade de o País alcançar o investment grade das agências internacionais. Essa chancela abriria as portas para recursos provenientes de fundos de investimento e outras instituições não autorizadas a investir em países classificados com graus de risco elevados. Em meio a toda essa euforia, uma dúvida continua no ar: o País será capaz de aproveitar efetivamente o bom momento para acelerar o processo de crescimento econômico de forma a mantê-lo entre Rússia, Índia e China no grupo dos Brics (países emergentes cujas economias têm potencial para superar a das maiores nações do mundo até 2050, de acordo com o banco de investimentos Goldman Sachs)? Ao que tudo indica, o dilema a ser enfrentado pela Nação será o de buscar soluções imediatas para um cenário com mais de 25% da população com renda abaixo da linha de pobreza ou construir, de fato, um novo panorama. Numa primeira análise, soluções como a elevação do salário mínimo e a ampliação de programas assistenciais, como o Bolsa-Família, parecem o caminho evidente. A questão, no entanto, é que estamos tratando de um problema de complexidade dinâmica. Assim, medidas óbvias podem gerar resultado no curto prazo, mas também serão as causas da intensificação dos problemas no futuro. O aumento do salário mínimo é emblemático, pois se trata de um instrumento de custo elevado no combate à miséria, por conta de seu impacto sobre as despesas previdenciárias, além de não atingir as pessoas dos últimos estratos da população. Sob esse prisma, medidas como o Bolsa-Família são mais eficazes. Não se trata aqui de questionar o compromisso político do governo de conceder aumentos reais ao salário mínimo ao longo de todo o período do segundo mandato. O ponto é ter claro o que, de fato, conseguiremos com ele. O custo de financiamento da Previdência chega a 12% do PIB. Apesar de aproximadamente um quarto referir-se a medidas voltadas a distribuir renda, gastamos muito mais do que nações com perfis demográficos e econômicos semelhantes. A conseqüência é simples, faltam recursos para os elementos realmente capazes de atacar a pobreza: investimento em infra-estrutura e educação. Na outra ponta do mesmo problema está o déficit da Previdência do funcionalismo público. A solução seria a criação de um fundo de pensão para os servidores da União, a chamada Funpresp. O sistema de Previdência complementar, inclusive, figura no atual cenário como solução para dois grandes entraves da economia nacional. Além de reduzir, no tempo, os déficits do sistema, também torna viável a ampliação da poupança interna, essencial para elevar a capacidade de investimento. As conseqüências são a criação de emprego e renda e todos os benefícios sociais gerados por esses elementos. Sob outro prisma, dá tratamento a uma questão de longo prazo. Já não somos uma nação de jovens e os avanços da tecnologia ampliam a expectativa de vida do brasileiro. Para uma Previdência pública já sobrecarregada, o aumento do período de gozo dos benefícios pagos pelo sistema torna impensável a manutenção das regras vigentes. Bem, o desafio está posto. Temos uma janela de oportunidade poucas vezes disponível em nossa história. Resta saber se não ficaremos imobilizados pelo bom momento vivido no presente, o que, certamente, terá conseqüências no futuro.