Título: Leilões já mostram a escalada dos preços
Autor: Pereira, Renée
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/07/2007, Economia, p. B4
Nos últimos dez anos, o preço da eletricidade subiu até 388%
A construção de Angra 3 dará continuidade a uma escalada de preços visível nos últimos leilões de energia feitos pelo governo. O aumento já terá início no ano que vem, com a entrada em vigor dos primeiros contratos de venda de energia nova. No caso das hidrelétricas, que venderam 1.660 MW médios nos últimos leilões, o valor está entre R$ 106,95 e R$ 126,77 o MWh, segundo dados do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Já as usinas térmicas, responsáveis pelo maior volume de venda (3.306 MW médios) nos últimos meses, o preço tem variado de R$ 121,81 a R$ 132,39 o MWh. Os valores são bem superiores aos obtidos na comercialização dos 19.499 MW médios da energia velha (cujo investimento já foi amortizado), entre R$ 57,51 e R$ 94,91 o MWh.
O problema é que boa parte dessa energia velha (9.054 MW médios), vendida por R$ 57,51, tem vencimento em 2013. ¿Será que nos novos contratos essa energia velha continuará com esses preços ou vai se igualar ao da energia nova?¿, questiona o professor da UFRJ Adilson de Oliveira.
Para ele, o consumidor pode preparar o bolso, pois nunca mais terá energia barata. Se com o preço das unidades antigas a tarifa cobrada dos clientes residenciais está em R$ 297,06 o MWh, imagina quando as novas usinas entrarem em operação, destacam especialistas. Nos últimos dez anos, o valor cobrado desses consumidores deu um salto de 147%. Já para a indústria a alta foi ainda mais expressiva: subiu 388% e atingiu R$ 211,87, segundo dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
Isso tem provocado uma gritaria geral entre os grandes consumidores, especialmente os eletrointensivos, cuja energia tem peso significativo no custo final do produto. Eles argumentam que estão perdendo competitividade no mercado internacional e que o País está liderando o custo do produto entre os integrantes do grupo Bric (Brasil, Rússia, Índia e China) desde 2004.
Um dos fatores que explicam o avanço do preço da energia no País é o fato de os aproveitamentos hídricos mais baratos já terem sido explorados. Apesar de o potencial ainda ser imenso no País, os novos projetos estão em áreas mais sensíveis do ponto de vista ambiental e, portanto, custam mais caro.
A maior expansão do setor elétrico ocorreu durante a ditadura militar, quando as mega-hidrelétricas foram construídas sem muitas preocupações ambientais e sociais. Tudo isso chamou atenção de movimentos ambientalistas, incluindo os internacionais, que passaram a pressionar o governo. Hoje para construir qualquer usina, grande ou pequena, os órgãos ambientais exigem uma série de estudos de viabilidade e altas compensações ambientais. Mas, mesmo com o aumento das exigências, a construção de hidrelétricas se transformou numa via-crúcis e tem comprometido a expansão da geração.
Com dificuldades para destravar os licenciamentos e urgência no aumento da oferta, o governo teve de lançar mão de fontes de energia mais caras e poluentes, como é o caso das térmicas movidas a óleo diesel e óleo combustível. As térmicas a carvão também ressurgiram como alternativa para salvar o País de um novo racionamento, assim como a energia nuclear.
Mas o aumento de térmicas no País é uma realidade necessária, até um certo ponto. Como as novas hidrelétricas não têm reservatórios e reduzem o volume de energia produzida em determinados períodos do ano, é importante ter a produção das termoelétricas para dar segurança ao sistema. Seria interessante, no entanto, avaliar alternativas menos poluentes e um pouco mais baratas. ¿Também não é o caso de iniciar um programa nuclear no País. Angra 3 é justificável pelo fato de os equipamentos já terem sido comprados¿, diz Oliveira.
Outra explicação para a escalada do preço da energia nos últimos anos é a carga tributária, em torno de 50%, afirma Gorete Paulo, da Fundação Getúlio Vargas (FGV-RJ). ¿Esse é um problema geral no País, é um problema que afeta o crescimento.¿ Só nos últimos sete anos, foram criados sete encargos e contribuições no setor.
O presidente da Associação Brasileira de Infra-Estrutura e Indústrias de Base (Abdib), Paulo Godoy, atribui o aumento da energia também à elevada tributação sobre os investimentos. Junta-se a isso o fato de algumas commodities necessárias para a fabricação dos equipamentos estarem em alta no mercado internacional, como é o caso do aço.