Título: Cinco mulheres, 25 crianças e lares ainda abertos a novos filhos
Autor: Dantas, Fernando
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/07/2007, Metrópole, p. C3
Cinco mulheres, 25 crianças e lares ainda abertos a novos filhos Nenhuma delas contou com ajuda do marido na criação
O dia mal amanhece e já se nota o movimento de mulheres no Jardim Elba, um dos bairros mais violentos da zona leste da capital paulista. No quintal das casas, elas colocam roupas no varal. Depois, levam crianças para creches e escolas ou seguem para pontos de ônibus. Fora do horário comercial, lotam as reuniões das pastorais da Igreja Católica e os cultos evangélicos. ¿Somos a força na periferia¿, observa Graça Fernandes, de 52 anos, líder comunitária de Sapopemba.
Sem apoio dos homens - alguns dependentes químicos e outros presos, mas muitos envolvidos com o crime -, que acabam morrendo cedo, criam os filhos sozinhas. O Estado participou de uma discussão com cinco delas. Juntas, têm 25 filhos e nenhuma contou com a ajuda do marido na criação. Apenas uma tem carteira assinada e trabalha em um programa de liberdade assistida. As demais vivem de bicos como faxina e costura.
Natalia Pereira Pimenta, de 57 anos, teve sete filhos. Veio de Januário, Minas, com três crianças, e teve outras quatro em São Paulo. O marido morreu logo depois. Para sustentar a garotada, trabalhou em casa de família e deixava os filhos com a mãe. Depois que a avó morreu, a filha mais velha assumiu os cuidados de todos. Natália tem ainda a filha adotiva, de 14 anos - de uma amiga que deu à luz na prisão. Abrigou também outras crianças que não tinham onde morar. Hoje, cuida de sete netos.
Natália teve dois filhos presos e outros dois assassinados no ano-novo de 2001. ¿O mais novo estava na vida errada. Mas acertaram também meu outro filho, que não tinha nada a ver e estava com ele.¿ Teve de convencer outro a não tentar vingança.
As surras domésticas, aplicadas por companheiros que bebem, são constantes nas narrações. Sonia Eli de Souza, de 35 anos, tem seis filhos. As três mais velhas - a maior de 14 anos - foram vítimas do primeiro marido da mãe, que as espancava. Os outros três filhos ¿levaram¿ do segundo companheiro. Mesmo assim, Sonia acredita que conseguirá levar todos a trilhar o ¿caminho certo¿. ¿Temos um exemplo sofrido em casa, que mostra que as drogas não levam a nada.¿ Ela cuida de um sobrinho, de 18 anos, que há cinco anos tenta abandonar o crack. O pai era traficante e matou a mãe, irmã de Sonia. ¿Para ele, a palavra do traficante é mais importante.¿
O compromisso com todas as crianças, aliás, faz parte da rotina dessas mulheres. Joseli da Silva Leite, de 29 anos, teve quatro. A primeira, aos 16 anos. Cada uma com um pai diferente. A mãe a ajudou até morrer, quatro anos atrás. Ela acha que os homens não sabem o que é amor de filho. Ela aprendeu com o tempo. ¿Hoje eu vivo para meus filhos, a única família que tenho.¿
Apesar dos problemas, todas dizem que não fariam aborto e nunca se arrependeriam de ter as crianças. O problema maior, elas avaliam, é arrumar o homem certo. Damares Gomes da Silva, de 39 anos, sete filhos, apanhou tanto do companheiro que diz ter ficado com trauma de homem. ¿Hoje, quando me olham em um bar, fico com raiva.¿ De todas, Ana Paula dos Santos Oliveira, de 39 anos, que tem só um filho, é a mais bem humorada ao falar do assunto. ¿O problema é que a gente só arruma homem que não presta.¿