Título: Agricultura da Argentina já sente efeitos do apagão
Autor: Palacios, Ariel
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/07/2007, Economia, p. B13

Crise de abastecimento ameaça colheita recorde de 100 milhões de toneladas de grãos e cereais

A crise energética que assola a Argentina desde a última semana de maio já está afetando intensamente a agricultura do país. O alerta é do presidente da Sociedade Rural, Luciano Miguens. Segundo ele, a falta de gás, gasolina e eletricidade está provocando uma queda do abastecimento dos insumos estratégicos para a produção de trigo, milho, soja, carne, leite, verduras e hortaliças. Segundo Miguens, a crise está 'pondo em risco' a colheita recorde de 100 milhões de toneladas de cereais e oleaginosas previstas pelo governo e analistas para este ano. 'O setor industrial que produz farinha, açúcar, óleo, carne, laticínios, sucos e vinhos já apresenta sérias dificuldades para continuar com seu trabalho.'

Sem gasolina e diesel, os produtores agrícolas não podem semear ou fazer as colheitas. A Sociedade Rural também alertou para uma alta dos preços dos produtos agrícolas: 'A forte crise energética repercutirá em um menor crescimento do PIB, em uma menor capacidade de abastecimento do mercado, além de provocar, adicionalmente, uma maior pressão inflacionária'.

'Os fornecedores de insumos estarão impossibilitados de proporcionar a quantidade necessária de fertilizantes agroquímicos e produtos veterinários tão requeridos para alcançar um abastecimento normal e melhorar a qualidade de diversidade de produtos que oferecemos tanto ao mercado interno como ao mundo', disse Miguens. O presidente da Sociedade Rural pediu ao governo que crie uma reserva estratégica de energia (diesel e gás) para abrandar a crise e evitar novos colapsos nos próximos anos.

A crise de energia paralisou as instalações da Profértil, a única fábrica de uréia granulada do país, fertilizante essencial para a agricultura. Essa fábrica, a maior do mundo - que requereu um investimento de US$ 750 milhões - produzia antes da crise 1,1 milhão de toneladas, um recorde jamais ultrapassado por seus concorrentes.

Segundo o Departamento de Estudos Econômicos da Bolsa de Comércio de Rosário, a falta de energia também está afetando os moinhos na Argentina. 'Os moinhos trabalham oito horas a menos por dia. Algumas fábricas decidiram fazer uma paralisação técnica. Desta forma, a oferta se retraiu. Mas a demanda continua tendo o mesmo nível', alerta. Segundo a analista Patricia Berguero, integrante do Departamento, os desajustes que o setor agroindustrial está padecendo com a escassez de energia 'estão gerando sobrecustos que a curto prazo serão transferidos no aumento de preços dos óleos, carne, laticínios e farinhas'.

As plantações de soja conseguiram driblar as secas e as chuvas intensas que se alternaram nos últimos meses na maior parte da zona de produção argentina. Além disso, conseguiram, com grande esforço dos produtores, evitar a falta de combustível no interior do país. A colheita de soja, segundo a Bolsa de Cereais de Buenos Aires, foi recorde, com 47,5 milhões de toneladas, 17,5% a mais do que a anterior.

Porém, a comemoração do recorde tem sido prejudicada pelos problemas na elaboração do produto para envio aos seus mercados no exterior. O problema, segundo a revista alemã Oil World, especializada em oleaginosas, é que a crise energética argentina está paralisando o pólo de indústrias de processamento de oleaginosas na área da cidade de Rosário, além de outras unidades no resto do país.