Título: Negociar com seriedade
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Fonte: O Estado de São Paulo, 11/07/2007, Notas & Informações, p. A3
Bravatas ainda fazem parte do arsenal que os dirigentes sindicais levam à mesa de negociações salariais, como mostra a disposição de alguns deles ouvidos pelo Estado. Mas sua utilidade, se algum dia foi relevante para os trabalhadores, hoje é praticamente nula. As condições da economia brasileira abrem espaço para negociações mais realistas e serenas, com benefícios, para os empregados, que vão além de aumentos reais de salário e são acertados por trabalhadores e empresas. Essas negociações dispensam ameaças e bravatas.
Os acordos salariais fechados nos últimos 12 meses em todo o País foram os melhores para os trabalhadores desde que, há mais de dez anos, o Dieese começou a compará-los. No ano passado, 96% dos 656 acordos firmados no País asseguraram pelo menos a reposição da inflação passada. Dos que não asseguraram a reposição integral, nenhum ficou mais de 1 ponto porcentual abaixo da inflação, o que significou perdas reais modestas. O dado mais importante da pesquisa foi a porcentagem dos acordos que resultaram em correção salarial superior à inflação acumulada até a data-base da categoria, ou seja, que asseguraram aumento real de rendimentos: 86% do total.
Os resultados do primeiro semestre deste ano, como mostrou reportagem de Marcelo Rehder publicada domingo neste jornal, foram ainda melhores do que os de 2006. Dos acordos firmados no período, 96,4% pelo menos repuseram a inflação e 85,7% asseguraram aumento real de salários. É um avanço pequeno sobre o resultado de 2006, mas uma indicação forte de que as condições continuam favoráveis para os trabalhadores.
A estabilidade econômica, o aumento real do salário mínimo proposto pelo governo e aprovado pelo Congresso e as perspectivas de crescimento da produção são fatores que explicam os ganhos para os trabalhadores inseridos nos acordos salariais mais recentes e que podem ser ampliados nos que serão negociados daqui até o fim do ano.
Categorias importantes, como metalúrgicos, químicos, bancários, eletricitários e petroleiros, já preparam sua pauta de reivindicações, que deverá incluir aumento real (proporcional ao ganho de produtividade do setor ou ao crescimento previsto do PIB) e outros itens, como benefícios sociais, maior participação nos resultados das empresas e qualificação profissional.
As condições da economia permitem que itens inovadores, como a implantação de um acordo nacional para cerca de 1 milhão de metalúrgicos ligados à CUT, sejam levados à mesa de negociações. O desempenho da indústria automobilística, que neste ano deve estabelecer novo recorde de produção e vendas, dá força aos que negociam em nome dos trabalhadores.
É justo, como diz o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo e da Confederação dos Metalúrgicos da Força Sindical, Eleno Bezerra, que os trabalhadores queiram ¿entrar no vácuo do crescimento econômico¿ para conseguir aumentos salariais. Também é compreensível que, para aproveitar o bom momento da economia, as categorias procurem antecipar o início das negociações, como anuncia que fará o presidente da Federação dos Químicos do Estado de São Paulo, Sérgio Luiz Leite.
É por isso tudo que não se justifica o comportamento belicoso de alguns dirigentes sindicais. ¿Sem luta não há conquista, e não descartamos a realização de greves e paralisações em todos os setores para fazer valer o nosso direito¿, disse ao Estado o presidente da Federação Estadual dos Metalúrgicos da CUT de São Paulo, Valmir Marques. ¿Vamos paralisar empresas que se negarem a negociar, justamente no pico de produção para o Natal¿, ameaçou o metalúrgico Eleno Bezerra.
Por permitir a conclusão de acordos que favorecem cada vez mais os trabalhadores, como tem ocorrido desde o início do ano passado, o bom desempenho da economia dispensa os choques entre empregados e empregadores. Fomentar previamente o confronto não ajuda ninguém, muito menos os trabalhadores, pois turva o ambiente de negociação e estimula a outra parte a responder com dureza.