Título: Governo flexibiliza regras para TV
Autor: Gallucci, Mariângela e Padiglione, Cristina
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/07/2007, Vida&, p. A18

Empresas vão comunicar autoclassificação ao Ministério da Justiça e não dependem mais de aprovação prévia

Pressionado pelas emissoras de televisão e pelo movimento organizado de artistas famosos, principalmente da TV Globo, o governo recuou e permitiu que a classificação indicativa seja por autoclassificação, sem qualquer análise prévia de conteúdo pelo Ministério da Justiça.

O governo também deu prazo de seis meses para as emissoras ajustarem a exibição dos programas aos fusos horários do País.

Em síntese, o Ministério da Justiça anunciou ontem regras mais flexíveis para o processo de classificação indicativa da programação televisiva. As empresas terão de comunicar oficialmente a autoclassificação ao ministério e não dependerão mais de uma prévia avaliação para começar a exibir os programas de sua grade.

Ficou estabelecida uma espécie de escala de vigilância. Durante 60 dias, o ministério fará um monitoramento da programação. No caso de abusos, a emissora será advertida por duas vezes. Se essa providência não surtir efeito, o ministério mudará a classificação. Se, mesmo assim, persistir o que for considerado abuso, então o fato será comunicado ao Ministério Público para que sejam tomadas medidas judiciais cabíveis.

Ontem, o secretário nacional de Justiça, Antônio Carlos Biscaia, apresentou os detalhes da portaria 1220, que deverá ser publicada no Diário Oficial de hoje. Biscaia afirmou que foram atendidas 18 das 24 reivindicações da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert).

Atores como Fernanda Montenegro e Tony Ramos defenderam publicamente mudanças do projeto original.

FAIXA ETÁRIA E FUSO HORÁRIO

A nova portaria mantém a vinculação entre faixas etárias e horários de exibição da programação. Mas o novo texto retira a expressão ¿terminantemente vedado¿ que constava nas regras anteriores de vinculação entre faixas etária e de horário.

¿A vinculação faixa etária-horária está mantida por ser uma determinação constitucional, (mas) desaparece o termo `terminantemente proibido¿¿, explicou Biscaia.

Pela portaria 1220, é considerada inadequada a exibição antes das 20 horas de programas classificados como não recomendados para menores de 12 anos.

Não deverão ser veiculados antes das 21 horas os programas não recomendados para menores de 14 anos. Ainda segundo a portaria, é inadequado exibir antes das 22 horas os programas não recomendados para menores de 16 anos e antes das 23 horas os não recomendados para menores de 18 anos.

O Ministério da Justiça determinou que as emissoras cumpram essas regras também em Estados com fuso horário diferente do de Brasília.

Para tanto, o governo deu um prazo de 180 dias para que as empresas adaptem a exibição de programas, adequando o horário à faixa etária. No Acre, por exemplo, a novela das 21 horas, exibida hoje naquele Estado às 18 horas, terá de ser veiculada às 21 horas do horário local.

As emissoras de TV por assinatura não estão sujeitas à vinculação faixa etária-horária porque oferecem aos pais e responsáveis dispositivos para bloquear a exibição de determinados programas.

As empresas terão de informar a classificação dos programas, mas poderão exibi-los no horário que desejarem. Programas jornalísticos, esportivos, propaganda eleitoral e publicidade não estão sujeitos às regras.

REAÇÕES

Contrárias à vinculação entre faixa horária e etária, item mantido no texto final da nova portaria, a Abert e a Associação Brasileira de Radiodifusores (Abra) informaram que só se manifestarão após a publicação do texto final no Diário Oficial da União.

O novo texto da portaria remete o embasamento jurídico das medidas diretamente ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). ¿Agora, se alguém quiser discutir as regras, terá de brigar contra o próprio estatuto¿, diz Guilherme Canela, representante da Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi).

Ele lamenta a exclusão do selo ER (Especialmente Recomendado) para programas voltados a crianças e adolescentes. ¿É um grande retrocesso para a própria lógica das emissoras, porque o ER trazia uma mensagem extremamente importante: já que estamos advertindo sobre as inadequações da TV, é bom que se ressalte as coisas que merecem ser especialmente recomendadas para crianças¿, avalia Canela.

Com as alterações, perde efeito liminar obtida pelas emissoras de TV em abril, no Superior Tribunal de Justiça, que eliminava qualquer obrigação das concessionárias em adequar conteúdo de programação a faixas horárias.

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) divulgou nota afirmando que a ¿classificação indicativa é não só oportuna como necessária¿ e que a entidade apóia ¿toda iniciativa que vise à defesa e à promoção dos direitos da criança e do adolescente considerando sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento¿.

A CNBB, contudo, ressalva que é preciso ¿adotar métodos que evitem que a classificação indicativa seja submetida a critérios políticos ou ideológicos¿.