Título: Argentina corta fornecimento de gás para o Chile
Autor: Palacios, Ariel e Guimarães, Marina
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/07/2007, Economia, p. B4

Produto exportado pelas empresas argentinas equivale a 90% do total importado pelo governo chileno

O governo do presidente Néstor Kirchner ordenou ontem às empresas que exportam gás para o Chile a suspensão total do fornecimento do produto para o outro lado da Cordilheira dos Andes. A medida foi confirmada pela Comissão Nacional de Energia do Chile, ao anunciar que ao longo do dia a remessa argentina através do Gasoduto Gas Andes 'será, a princípio, de zero metro cúbico'. O gás argentino representa 90% do total importado pelo Chile.

Mas, segundo as autoridades chilenas, se a suspensão argentina for transitória, o país evitará problemas energéticos imediatos graças ao gás acumulado nas tubulações dos gasodutos em território chileno. Esse gás, em um total estimado de 7,5 milhões de metros cúbicos, seria suficiente para o período de quase uma semana.

Além disso, na semana passada, o governo do Chile lançou uma campanha intensiva para que a população economizasse energia.

Os contratos assinados entre os dois países nos anos 90 estipulavam o envio de 22 milhões de metros cúbicos diários. Mas, desde 2004, Kirchner determinou um envio cada vez menor de gás para o Chile, para evitar que o produto faltasse para as indústrias argentinas e os consumidores residenciais.

Em maio, o fornecimento para o Chile já era exíguo, com apenas 1,5 milhão de m3 diários. Entre o fim de semana e a terça-feira, o fornecimento foi reduzido para 1,2 milhão de m3.

O consumo residencial e comercial da área da Grande Santiago, o maior centro urbano chileno, é em média de 1,5 milhão a 2 milhões de metros cúbicos diários.

DIVISÃO

De acordo com o economista especializado em energia Daniel Montamat, ex-secretário de Energia, o governo argentino 'está dividido entre assumir a crise, o que representa partir para um racionamento geral de energia e arcar com o custo político da medida, ou continuar fazendo jogo de cena culpando as empresas até as eleições'. No primeiro time, está a equipe de técnicos do secretário de Energia, Daniel Cameron, que negociou com o Brasil o aumento de importação de eletricidade.

No segundo grupo, encontra-se o secretário de Comércio Interior, Guillermo Moreno, que ficou famoso em 2005 como o 'xerife dos preços'. Moreno foi quem negociou com as empresas o congelamento de preços. Mas desde janeiro vem perdendo poder com o descongelamento automático dos preços por força da inflação em alta. Ele também é acusado pelos funcionários do Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (Indec) de participar da manipulação dos índices da inflação.

Como Moreno está sendo investigado pela Justiça por essas denúncias, o presidente Kirchner o tinha deixado no freezer até a chegada do inverno. Com o recrudescimento da crise energética, Kirchner lançou mão do xerife para pressionar as empresas energéticas com 'um coquetel de medidas drásticas, negação da realidade e subsídios, uma marca inconfundível do indigesto secretário de Comércio Interior', como definiu o analista do jornal La Nación, José Luis Brea.