Título: Medo do 'made in China' cresce nos Estados Unidos
Autor: Martin, Andrew
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/07/2007, Economia, p. B13

Riscos à saúde estimulam movimentos contra produtos chineses

Houve um tempo em que as palavras 'made in China' evocavam imediatamente a idéia de 'inferior'. Ultimamente, muitos americanos têm pensado em 'perigo'.

Depois de notícias sobre pasta de dentes envenenada, pneus que se despedaçam e peixes e ração de animais de estimação contaminados, quem não se assustaria? (ler mais na pág. A15) Para alguns, no entanto, esses temores são um sonho que vira realidade. É o caso de políticos, criadores de bagre e ativistas pró-direitos do consumidor, para citar apenas alguns.

Durante anos, esses grupos questionaram a salubridade dos produtos da China enquanto faziam campanha por suas causas. Agora, eles comemoram a chance de um ataque reforçado. Os produtores de bagre e camarão do sul do país, por exemplo, invocavam imagens de tanques asiáticos borbulhando com antibióticos e poluentes, mas não recebiam atenção dos órgãos reguladores.

'Detectamos produtos químicos proibidos e outros aditivos nos peixes há bastante tempo', disse Dick Stevens, executivo-chefe da Consolidated Catfish, no Mississippi. 'Mas fomos praticamente ignorados quando dissemos isso.'

Os fazendeiros das Grandes Planícies têm feito campanha pela inclusão do país de origem no rótulo dos produtos agrícolas, acreditando que as iniciais 'USA' garantem vantagem. Em 2002, foi aprovada uma lei para incluir a informação na maioria dos produtos agrícolas, mas as indústrias de carnes e outros alimentos lançaram uma campanha e conseguiram impedi-la de entrar em vigor, a não ser para frutos do mar. Agora, a China oferece, sem querer, um impulso à sua causa.

'Creio que vocês percebem, com esse escândalo chinês, que os problemas no suprimento de alimentos representam riscos reais para as pessoas e os animais de estimação', disse o senador democrata Kent Conrad, de Dakota do Norte. 'As pessoas acreditam ter o direito de saber de onde vem sua comida.'

O advogado William Marler diz que as notícias sobre alimentos contaminados da China criaram muitas oportunidades. Ele é especializado em representar clientes que adoeceram por consumir alimentos estragados. Seu caso mais recente foi contra o fabricante de um produto chamado 'Veggie Booty', um salgadinho popular entre as crianças. Em alguns sacos, o tempero 'veggie' (vegetariano), fabricado na China, estava contaminado por salmonela, que deixou ao menos 57 pessoas doentes.

'Meu palpite é que, com o aumento da globalização, os bilhões de dólares em jogo e a negação do problema pelos chineses, é melhor eu recapitular meu chinês', escreveu Marler em seu blog.

No Congresso, os problemas com os produtos chineses já renovaram a argumentação dos defensores dos direitos do consumidor e dos parlamentares que, no fim dos anos 90, opuseram-se ao ingresso da China na Organização Mundial do Comércio (OMC). Na época, a maioria das objeções envolvia direitos humanos, trabalho e meio ambiente. Agora, a questão é a segurança.

'Aplicamos padrões bem rígidos para alimentos e drogas', afirmou a deputada democrata Marcy Kaptur, de Ohio. 'Os importadores estão sempre tentando diminuir essa rede de segurança.' Obviamente, o impacto dos escândalos a longo prazo dependerá de quantos produtos com defeito ainda surgirão e - por mais sombrio que possa soar - de quantas pessoas ou animais de estimação ainda poderão se ferir, adoecer ou morrer. De qualquer modo, eis um palpite razoável: um pedido dos chineses para exportar frango cozido para os EUA, em estudo pelo Departamento de Agricultura, será arquivado.

Enquanto isso, outros grupos também esperam ser beneficiados. Os congressistas que defendem padrões mais rígidos para o sistema de segurança alimentar do país agora têm mais um exemplo do que pode dar errado quando a vigilância falha. E os protecionistas têm mais um argumento contra os acordos de livre comércio.

Mas a realidade é que as importações de produtos da China continuarão a crescer. Os artigos simplesmente são baratos demais e estão por toda parte.

Sara Bongiorni já sabe disso. Ela decidiu que sua família tentaria passar um ano inteiro sem usar produtos fabricados na China. Suas descobertas estão detalhadas no livro recém-lançado A Year Without 'Made in China': One Family's True Life Adventure in the Global Economy (Um ano sem 'Made in China': a aventura real de uma família na economia global).

'Em nenhum lugar é possível viver uma vida normal sem comprar coisas da China', diz Bongiorni. Ela observa, por exemplo, que quase todos os aparelhos telefônicos fixos e celulares são fabricados lá.