Título: Corpos no rio fazem peixe sair do cardápio em Bagdá
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Fonte: O Estado de São Paulo, 11/07/2007, Internacional, p. A14

Os peixes do Rio Tigre estão fora do cardápio em Bagdá. Corpos encontrados com freqüência no rio tiraram o apetite da capital iraquiana pelo Masqouf, popular prato de carpa grelhada. Clérigos advertem que os peixes estão se alimentando dos corpos em decomposição.

¿Eles espalham boatos sobre os peixes. Dizem que estão comendo os corpos de pessoas afogadas. Mas é só um boato¿, contou Hussein Ahmed, um pescador de 62 anos, depois de lançar suas redes perto do complexo fortificado da Zona Verde, à margem do Tigre.

Vários corpos surgem a cada semana em Bagdá. São vítimas da violência entre a maioria xiita e a minoria sunita, que empurra o Iraque em direção a uma guerra civil total. Muitos são jogados no Tigre, que cruza o coração da cidade e já foi ladeado por restaurantes especializados no Masqouf - que as pessoas adoravam saborear na sexta-feira à noite. A maioria dos restaurantes à margem do rio fechou há muito tempo, por causa dos ataques a bomba que fazem parte do dia-a-dia de Bagdá desde a invasão liderada pelos EUA, em 2003.

Os pescadores, que dependem do Tigre há gerações, ainda podem ser vistos lançando redes sob as pontes de Bagdá e em meio à vegetação e aos bancos de areia nas margens do rio. Mas esses pontos naturais de pesca também trazem corpos flutuando, e os pescadores de Bagdá sabem que a guerra contamina seu meio de vida.

¿As pessoas começaram a evitar os peixes do rio por causa dos corpos. O comércio de peixes mudou completamente¿, afirmou Yassir al-Qurayshi, de 36 anos, numa banca de peixes em Karrada, bairro rico na região central de Bagdá. Uma fatwa (decreto religioso) proibindo a população de comer peixes do Tigre foi noticiada pela mídia iraquiana recentemente, mas a fonte original não ficou clara.