Título: Em Bariloche, a explosão do turismo de inverno e o medo do apagão
Autor: Palacios, Ariel
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/07/2007, Economia, p. B8
Crise de energia ignorada pelo governo Kirchner é motivo de preocupação na principal estação de inverno do país
O apagão de 15 horas que afetou 75% de Bariloche entre a noite de terça-feira e o meio-dia da quarta-feira não tirou o sono das autoridades das áreas de energia e turismo da cidade, que conseguiram recompor o abastecimento, além de evitar o mal-estar dos turistas que abarrotam as ruas e pistas de esqui em plena temporada de neve.
Porém, o foco das preocupações das autoridades está a 1.680 quilômetros dali, na capital do país, Buenos Aires, mais especificamente na Casa Rosada, onde o presidente Néstor Kirchner busca formas controvertidas de driblar a crise de energia - anunciada há três anos pelos analistas, mas ignorada pelo governo.
O apagão de Bariloche, segundo a Cooperativa de Eletricidade de Bariloche (CEB) - uma empresa local de energia - não foi causado pela crise energética nacional, mas sim por uma falha na linha de alta-tensão do sistema federal que abastece a cidade. O problema, afirmam, foi causado pelas nevascas que atingiram a região (e derrubaram a temperatura a 18 graus Celsius negativos).
Segundo explicaram ao Estado o conselheiro executivo da CEB, Pablo Frisch, e o porta-voz da cooperativa, Luis Baigorria, nas horas de pico, a empresa pode abastecer de 20% a 25% da demanda da cidade. Em horários de consumo normal, chega até 45%. Frisch sustentou que a idéia em Bariloche é 'privilegiar a principal base de sustento da cidade, ou seja, o turismo. Em segundo lugar, a área residencial'.
Autoridades de Bariloche revelaram que o temor é que a cidade fique refém da crise energética nacional: 'Nunca se sabe se uma hora vão ordenar lá da capital que se destine a energia que nos corresponde para uso em Buenos Aires'.
Ao contrário do governo Kirchner, que não implementou uma campanha nacional de economia de energia - para não admitir a existência da crise - as autoridades de Bariloche pediram a seus cidadãos que fossem 'racionais' no consumo. Com esse apelo, conseguiram uma economia de 8% a 10%.
A secretária de Turismo de Bariloche, Alicia Longoni, disse ao Estado que a crise energética 'pode fazer com que um turista pense duas vezes em ir à Argentina, mas não duvidará em ir à Bariloche'. 'Aqui, a falha se resolveu. Talvez possa acontecer outro apagão. Mas, da mesma forma que pode ocorrer em Nova York ou Paris.'
De acordo com a secretária, 'Bariloche está mais preparada que o resto do país'. 'Aqui aplicaremos a política de proteger a indústria do turismo, ou seja, os hotéis e o centro da cidade, dedicado ao comércio.'
Segundo Longoni, quase 35% dos 850 mil turistas que visitam Bariloche anualmente são estrangeiros. E, segundo as últimas estatísticas disponíveis (de 2005), 72% dos visitantes entre julho e agosto eram brasileiros, proporção significativamente superior a dos turistas de outros países. O segundo grupo são os mexicanos, com 5%, enquanto os chilenos representam 4,9%. Segundo dados acadêmicos, o turismo representa 42% do Produto Interno Bruto (PIB) de Bariloche.
O número de turistas brasileiros, segundo fontes do setor, aumentou 'consideravelmente' desde o ano passado, principalmente pelo câmbio favorável. Os empresários do setor turístico calculam que nesta temporada - do final de junho até final de setembro - cerca de 30 mil brasileiros visitarão Bariloche.
EXCEÇÃO
O Ente Oficial de Turismo Patagônia Turística - que reúne as cinco províncias do sul do país - expressou ao governo sua preocupação pelos 'problemas de abastecimento de energia elétrica' nos centros turísticos destinados às atividades de inverno. Além disso, pediu que esses centros sejam considerados 'exceção' nas restrições do consumo de grandes usuários impostas pelo governo.
Segundo o organismo, a situação 'compromete seriamente os esforços do setor turístico, público e privado, para transformar o mesmo em gerador de fontes de trabalho e riquezas'.
Enquanto em Bariloche e outras cidades do interior da Argentina predomina a preocupação com a situação da energia, o presidente Néstor Kirchner continua negando a existência de uma crise. Esse termo, inclusive, está vetado entre os integrantes do gabinete presidencial, que só podem referir-se a 'problemas pontuais'.