Título: 'Há risco de divórcio entre governo e PMDB'
Autor: Assunção, Moacir
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/07/2007, Nacional, p. A6

Para especialista, perigo vai permanecer enquanto Lula não conseguir se livrar dos casos de Renan e Rondeau

Observador atento das articulações partidárias no Congresso, o cientista político Rogério Schmitt, da Tendências Consultoria, prevê riscos de ¿trinca¿ nas relações entre o PMDB, maior partido da coligação governista, e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao menos enquanto durarem a ¿fritura¿ do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e a indefinição do novo ministro de Minas e Energia, cargo antes ocupado pelo peemedebista Silas Rondeau.

A razão é que esses cargos são as jóias da coroa do PMDB, que tem votado disciplinadamente em bloco no governo com mais fidelidade até do que no governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), de que o partido também foi aliado. Quando essas situações delicadas se resolverem, para Schmitt, a paz deve voltar a reinar nas hostes governistas.

O sr. acha que existe um risco concreto de divórcio ou, ao menos, de separação amigável no casamento entre o PMDB e o governo?

Há um risco, que vai permanecer enquanto estes casos do Renan Calheiros e do Silas Rondeau permanecerem no horizonte. Agora, se o novo presidente do Senado for um peemedebista - tem se falado em Gerson Camata (ES), Garibaldi Alves (RN) e até em José Sarney (AP) - e houver a recondução de Rondeau, que já foi cogitada pelo governo e depois esquecida, aí se pode dizer que o risco está descartado. Por enquanto, há uma possibilidade grande de o Ministério de Minas e Energia, o mais importante ocupado pelo partido, passar a ser dirigido por um quadro técnico, não necessariamente ligado a legendas partidárias. A questão é que os dois casos já se arrastam há um mês e meio e a proposta de prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), que representa uma arrecadação de R$ 39 bilhões para o governo, não tem andado porque o relator na Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), está esperando a definição do ministro.

O PMDB é o maior partido da base de apoio do presidente Lula e garante a maioria folgada do governo, tanto no Senado quanto na Câmara. O que ocorreria se houvesse problemas nesta relação, em termos institucionais?

O governo perderia a maioria nas duas Casas. No Senado, a maioria governista é de cerca de 60% dos 81 senadores e na Câmara, de 70%. A possibilidade de o PMDB deixar a base ainda parece improvável, mas se isso ocorresse o presidente Lula ficaria em situação delicada e seu governo se transformaria em um governo de minoria, ao contrário do que ocorre atualmente. Não é que tivesse problema de governabilidade, mas teria de negociar pontualmente todos os projetos. Isso faria com que tudo ficasse mais lento e o custo político aumentasse bastante. No caso da proposta da CPMF, só para citar um exemplo, a situação poderia ficar complicada para aprová-la no tempo necessário, em termos legais.

Mudando um pouco de assunto, Renan enfrenta uma situação muito difícil. Quanto tempo mais o sr. acha que ele conseguirá se manter na presidência do Senado?

O fato de ter resistido até agora demonstra que Renan é um sobrevivente. Está em processo de fritura, mas tem mostrado que ainda tem alguma força política. O ex-presidente da Câmara Severino Cavalcante (PP-PE), por exemplo, sobreviveu somente três semanas depois das denúncias do chamado mensalinho. Renan já está na luta há pelo menos o dobro do tempo e deve se segurar até o fim do recesso parlamentar. Ele tem recebido algum apoio, como dos prefeitos alagoanos, mas perdeu o que realmente conta que é o dos colegas senadores e do governo. Não sabemos qual o teor da conversa dele com o presidente, mas Lula pode ter dito que sua presença no Senado vai começar a criar dificuldades para o governo. O ritmo das votações na Casa tem diminuído bastante e isso pode causar problemas em momentos mais sensíveis. Para Renan, por sua vez, deixar de ser presidente do Senado significa perder projeção nacional e voltar a ser um político regional em um Estado pobre, distante do centro político.

Se ocorressem problemas mais sérios nas relações entre o partido e o governo seria possível encontrar um substituto à altura na coalizão?

Principalmente no Senado seria bem difícil. Nessa Casa o governo tem 60% dos votos e sem o PMDB cairia para algo em torno de 35%. Na Câmara, seria mais fácil e o Planalto chegaria perto de ter 45% dos votos sem o PMDB. Isto quer dizer que no Senado seria minoria absoluta e teria que negociar tudo, já que o PMDB é, proporcionalmente, maior lá do que na Câmara. Nesta segunda Casa, apesar de tornar-se minoria, o governo teria uma situação mais tranqüila, já que controlaria quase a metade dos deputados. O PMDB é, sem dúvida, o fiel da balança e tem demonstrado mais fidelidade ao governo do PT do que ao do PSDB, que o precedeu.