Título: Pane no Cindacta. E o caos volta, um dia após pacote
Autor: Alves,André., Nossa,Leonêncio e Veríssimo, Renata
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/07/2007, Metrópole, p. C1

Curto-circuito deixou às escuras o Cindacta-4, em Manaus, e forçou aviões vindos dos EUA a retornarem ou pousarem noutros países; dos vôos internos, 44% atrasaram

O caos voltou ontem aos aeroportos, um dia depois de o governo ter anunciado um pacote que prevê a alteração da malha de vôos do País - e quatro dias depois de um Airbus da TAM ter saído da pista do Aeroporto de Congonhas, atingindo um prédio e matando quase 200 pessoas. O centro de controle aéreo de Manaus (Cindacta-4), que responde por 90% do tráfego entre Brasil, Estados Unidos e América Central, ficou às escuras durante três horas, em virtude de um curto-circuito no sistema de energia elétrica. A pane obrigou aviões vindos do exterior a aterrissarem em outros países e provocou atrasos em 44,7% dos 1.282 vôos internos programados até as 18h30. Outros 11,2% foram cancelados.

À 0h45, os terminais do Cindacta-4 usados para monitorar vôos saíram do ar. ¿Os aviões foram obrigados a ficar taxiando sobre os céus de Manaus, às cegas¿, contou um controlador. ¿Alguns colegas começaram a chorar. Foi desesperador.¿ Para evitar uma tragédia, os controladores usaram rádios da Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária (Infraero). Segundo a Aeronáutica, havia 17 aeronaves em vôo, das quais 8 tiveram as rotas modificadas. A situação só foi normalizada a partir das 2h30.

O Aeroporto de Miami informou que quatro vôos da American Airlines, com destino a São Paulo e ao Rio, retornaram à Flórida. No Aeroporto de Cumbica, Guarulhos, cinco aviões tiveram de voltar depois de chegarem ao limite da área monitorada pelo Cindacta-4.

Passageira de outro vôo da American, no trajeto Dallas-São Paulo, Vitória Toscano Laselva, de 15 anos, foi parar em Santiago do Chile. O avião tinha decolado no fim da tarde de sexta-feira, com previsão de pouso no Aeroporto de Cumbica, Guarulhos, às 6 horas. Tudo estava tranqüilo quando, no fim da madrugada, as pessoas começaram a acordar e a reparar que a tela dos vídeos com mapas do trajeto indicava que o avião se aproximava de Santiago. ¿Perguntamos para a aeromoça o que estava acontecendo. Depois de algum tempo ela voltou com a resposta que havia algum problema no Brasil¿, disse Vitória. ¿A maioria das pessoas ficou calma, pois o que importava mesmo era a segurança.¿

Os passageiros ficaram no aeroporto de Santiago, porque a companhia alegou não ter encontrado hotel para abrigá-los. A American conseguiu pôr Vitória e alguns outros passageiros num vôo da LanChile que chegou no início da noite a Guarulhos. Os demais deveriam desembarcar só às 3h45 de hoje.

Em nota, a Aeronáutica informou que houve ¿uma anormalidade¿ em geradores do Cindacta-4. O problema teria sido detectado por volta das 23 horas de sexta, numa inspeção de rotina, mas não comprometia o controle de tráfego. Porém, durante um procedimento de manutenção, houve um curto-circuito que prejudicou a alimentação das baterias do sistema.

A Aeronáutica negou ter havido risco de acidentes. Conforme a nota, as comunicações passaram a ser operadas com os equipamentos ¿high frequency do Centro Amazônico, onde as equipes foram reforçadas.¿

Com a pane, o aeroporto mais prejudicado foi o de Belém, com 88,8% de atrasos até 18h30. Em Cumbica, o porcentual chegou a 37,7%. No Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, o vilão foi o mau tempo. O terminal ficou fechado das 6h38 às 7h41 e das 8h40 às 10h25, provocando atrasos em 84,4% dos vôos. Em Congonhas, às 21 horas, o porcentual de atrasos chegava a 21,6% e o de cancelamentos, a 28,3%.

O caos levou o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin a desistir de ir ao enterro do senador Antonio Carlos Magalhães, morto anteontem, em Salvador. Alckmin divulgou nota afirmando que chegou às 8h30 a Cumbica e até 14h30 não havia nem previsão para o embarque.

O apagão acelerou no Planalto a análise de nomes que podem substituir o ministro da Defesa, Waldir Pires, e o presidente da Infraero, José Carlos Pereira, que devem ser demitidos esta semana. E provocou uma onda de críticas de congressistas. Para eles, o pacote de sexta se limitou à tentativa de desafogar Congonhas, para responder à indignação causada pela tragédia do Airbus. E não contemplou os itens essenciais para atacar a crise na aviação: investimento em controle de vôos, infra-estrutura e gestão aeroportuária.