Título: Jorro de capitais
Autor: Ming, Celso
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/07/2007, Economia, p. B2

Já se esperava que a injeção de capital estrangeiro no Brasil fosse forte em junho, mas ninguém poderia imaginar que saltaria US$ 10,3 bilhões, recorde histórico num único mês.

Pelo menos US$ 5,3 bilhões entraram como pagamento do Grupo Mittal aos acionistas minoritários da Arcelor. Houve outras inversões em capacidade já existente. Mas não dá para negar que é crescente o investimento destinado ao aumento de capacidade de produção, o que mostra impressionante interesse novo por investimentos. Aí está importante indicador da economia, cujas projeções estão desatualizadas.

O Banco Central, sempre tão conservador, parece estar na frente do resto do mercado. Projeta para todo o ano uma entrada de Investimentos Estrangeiros Diretos (IED) de US$ 25 bilhões. Enquanto isso o mercado, conforme Pesquisa Focus do Banco Central, ainda não passou dos US$ 23 bilhões. Nos últimos 12 meses terminados em 30 de junho, a entrada de IED alcançou US$ 32,3 bilhões (ver gráfico).

É possível conferir ao menos quatro fatores que puseram o Brasil na mira dos investidores estrangeiros. O primeiro é a forte melhora da percepção externa sobre o comportamento da economia. Inflação sob controle, reservas agora a US$ 153,3 bilhões e retomada do crescimento (hoje em torno dos 4,5% ao ano) são elementos que garantem previsibilidade ao investidor.

O segundo fator é a fartura de recursos externos. Se sobra dinheiro lá fora e, do ponto de vista do investidor, as condições do Brasil estão melhorando, não há como evitar o afluxo.

O terceiro é a descoberta pelo resto do mundo das enormes vantagens comparativas do Brasil na produção de biocombustíveis, especialmente etanol. E o quarto é a proximidade do reconhecimento do grau de investimento. Ontem, a Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (Sobeet) entrou na discussão sobre se esse fator é ou não relevante para explicar a forte entrada de investimentos. A partir de um levantamento feito sobre o que aconteceu com cinco emergentes (África do Sul, México, Bulgária, Rússia e Romênia) concluiu que, com exceção da África do Sul, há a tendência à antecipação de IED. Porém o crescimento maior acontece depois. O caso do Brasil não necessariamente será parecido ao desses países - até porque as condições da economia mundial podem mudar.

De todo modo, a predisposição do capital estrangeiro em procurar oportunidades de longo prazo no Brasil esbarra em sérios obstáculos. O caos da aviação civil e o risco de apagão energético são demonstrações do que acontece na infra-estrutura.

É claro que esse também seria bom argumento para investir aqui. Mas aí esbarramos em um segundo gargalo: a falta de marcos regulatórios (regras do jogo), confiáveis para deixar que esses capitais operem no País. E podemos acrescentar uma lista enorme de problemas: excessiva carga tributária; altíssimos encargos sociais; lerdeza e falta de confiança na Justiça...