Título: 2.500 na Catedral em missa por vítimas
Autor: Mayrink, José Maria
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/07/2007, Metrópole, p. C5

Familiares aplaudem crítica de padre a gesto obsceno de Garcia

Orações, revolta e lágrimas. A emoção dominou os parentes, amigos e colegas de trabalho que assistiram, às 11 horas de ontem, à missa celebrada pelo arcebispo de São Paulo, d. Odilo Scherer, na Catedral da Sé. Eram cerca de 2.500 fiéis cantando e rezando pelas vítimas do Airbus da TAM. Assessor de comunicação da arquidiocese, o padre Juarez Pedro de Castro criticou, no altar, a reação do assessor da Presidência da República Marco Aurélio Garcia, na quinta-feira, ao ouvir pela TV uma versão de que uma falha mecânica poderia ser uma das causas do acidente. ¿A resposta (das autoridades) não pode ser o silêncio, nem o descaso e, muito menos, gestos obscenos.¿ A multidão aplaudiu.

Mais tarde, o arcebispo desconversou após ser questionado por jornalistas sobre a forma como Garcia reagiu. ¿Gestos obscenos eu não vou comentar aqui dentro da igreja.¿ Indagado se poderia se manifestar fora da catedral, disse: ¿Quem fez os gestos que os comente¿.

A cerimônia, para a qual foram convidadas também autoridades, foi um gesto concreto da Igreja de apoio às famílias de todos os que morreram na tragédia. ¿Queremos dizer a todas essas pessoas que estamos sofrendo com elas¿, disse d. Odilo.

Muitos parentes levaram à catedral cartazes e imagens das vítimas. ¿Katiane, nunca te esqueceremos¿, dizia um cartaz, com a fotografia de Katiane Maliszewski, vestida de beca, no dia de sua formatura. ¿Fizemos juntos o curso de analista de sistemas na PUC de Porto Alegre¿, afirmou o namorado, Marcos.

Lígia Dembinski também chorava, amparada pelo marido, Mário Pallares. Ela perdeu a mãe, Élida, de 55 anos. ¿Não pode acontecer de novo¿, repetia ela, pedindo investigação séria sobre a tragédia.Quando d. Odilo cobrou o mesmo, todos aplaudiram - inclusive as autoridades, na ala esquerda da nave central da igreja. Ali estavam, entre outros, o prefeito Gilberto Kassab, o secretário estadual de Justiça, Luiz Antônio Marrey, e o procurador-geral de Justiça, Rodrigo Pinho. Em luto pela morte de sua mãe, na sexta-feira, o governador José Serra não esteve presente. Não havia nenhum representante do governo federal.

Os funcionários da TAM que foram à cerimônia não quiseram dar entrevistas - ¿não estamos autorizados¿, diziam -, mas o veterano Luiz Antônio de Oliveira Santos, comandante de Airbus A300, usado em rotas internacionais, não deixou de lembrar os amigos que morreram em Congonhas. Ele não comentou questões técnicas - só queria falar da saudade dos pilotos e comissários que estavam no vôo JJ 3054.

SAIA-JUSTA

Durante a eucaristia, Malu Golberto, viúva do gerente de desenvolvimento da TAM Express, Antônio Golberto Filho, morto no acidente, se aproximou de Marrey para cobrar providências. Revoltada, ela não parava de falar. ¿Já estou exausta de governos corruptos, de engravatados que não têm nenhum respeito por nós¿. Constrangido, o secretário lhe pediu paciência. ¿É compreensível que haja manifestações para pedir pressa, mas achei inadequado que ocorresse durante a missa¿, afirmou.

LEMBRANÇA

Na procissão do ofertório, quando são levados ao altar o pão e o vinho a serem consagrados na eucaristia, muitos parentes deixaram sobre a mesa das ofertas os cartazes e fotografias das vítimas que tinham nas mãos. Rodrigo, Maria Isabel, Fabiane... Em alguns casos eram só os nomes, ao lado de rostos felizes, a última lembrança que todos queriam guardar .

¿A resposta (das autoridades) não pode ser o silêncio nem o descaso e, muito menos, gestos obscenos¿

Padre Juarez de Castro Assessor da Arquidiocese

¿Gestos obscenos eu não vou comentar aqui dentro da igreja. Quem fez os gestos que os comente.¿

D. Odilo Scherer Arcebispo de São Paulo

¿Já estou exausta de governos corruptos, de engravatados que não têm nenhum respeito por nós¿

Malu Golberto Viúva de gerente da TAM

¿Nós somos informados sobre os acontecimentos envolvendo o acidente, e o andamento das investigações, pelos jornais.¿

Maurício Pereira Médico e pai de uma vítima

¿Meu filho está abandonado em caminhões-frigorífico. Não é possível que só 50 pessoas tenham sido reconhecidas.¿

Luiz Antônio Salcedo Pai de uma vítima

¿Políticos e pessoas importantes já foram reconhecidas. Enquanto isso, minha filha, uma simples analista de sistemas, está lá¿

Tereza Maliszewski Mãe de uma vítima

COLABOROU HUMBERTO MAIA JUNIOR