Título: Bobagem recorrente
Autor: Ming, Celso
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/07/2007, Economia, p. B2

Nos dois últimos dias, três autoridades desmentiram medidas destinadas a controlar o câmbio.

Segunda-feira, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou que é falsa a notícia de que o governo vai elevar o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) cobrado sobre a entrada de capital externo no País. O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, disse, também na segunda-feira, que 'é errada a idéia de aumentar o IOF sobre a entrada de capitais externos'. Ontem, o presidente Lula declarou, em Brasília, que 'é preciso aguardar com paciência que o dólar se acomode'. E completou: 'Não me peçam medidas intempestivas.'

Se uma decisão sobre câmbio é desmentida taxativamente duas vezes e desestimulada por outra declaração do presidente da República, é porque algo vinha sendo tramado.

Há alguns meses, a entrada de capitais pelas contas financeiras era irrelevante. Hoje, já não é. O superávit da balança comercial (exportações menos importações) nos primeiros seis meses do ano foi de US$ 20,7 bilhões. Em Investimentos Estrangeiros Diretos (IED), a entrada líquida, também em seis meses, não deve ter passado dos US$ 11 bilhões. No entanto, nesse mesmo período, o Banco Central comprou US$ 61,4 bilhões. Isso mostra que a entrada de capitais financeiros se transformou em fator importante de valorização do real. Como esse afluxo tende a aumentar, seja pela derrubada do prêmio de risco, seja pela aproximação do grau de investimento, é natural que aumentem as pressões para que o governo vire esse jogo.

A idéia de aumentar o pedágio (IOF) de 5% para 25% sobre a permanência de capitais de curto prazo para reduzir a entrada de capitais se apóia em três exemplos malsucedidos. O Chile adotou essa política em 1991, mas a abandonou em 1998, por considerá-la ineficiente. A Tailândia foi por esse caminho em dezembro e produziu um cataclismo a ponto de ter de voltar atrás. A Colômbia impôs uma quarentena à entrada de moeda estrangeira em maio, mas não conseguiu reverter a tendência de valorização do peso, como o próprio ministro Mantega vem reconhecendo.

Há uma pilha de argumentos que demonstram a falta de sentido de uma providência como essa, se o objetivo é evitar a valorização da moeda. Mas basta apenas um.

Capital de curto prazo é aquele que vem e volta em até 90 dias. Quando entra, deixa dólares no câmbio e tende a valorizar a moeda nacional, ou seja, a derrubar a cotação do dólar. Mas, quando sai, trabalha em sentido contrário: para desvalorizar a moeda.

Se desestimulasse a entrada, o governo desestimularia também a saída; portanto desestimularia o que gostaria que acontecesse: a desvalorização do real.

Além do mais, capitais de curto prazo são como passageiros de metrô. Há os que chegam e os que vão embora. Os que entram deixam dólares e os que saem levam. Ao longo de um tempo, o resultado líquido tende a ser zero.

Temer a valorização da moeda por capitais de curto prazo é uma bobagem que só ocorre a quem não entende esse efeito. Mas no Brasil é uma bobagem recorrente, que vai e volta, como esses capitais.