Título: 'Mercados devem cair ainda mais'
Autor: Modé, Leandro
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/07/2007, Economia, p. B3

Ricardo Amorim: diretor do Banco WestLB

Correção das bolsas de valores mundiais está apenas começando, mas não há uma mudança de tendência, diz executivo

O diretor de Pesquisa Econômica e Estratégia para América Latina do Banco WestLB, Ricardo Amorim, acredita que a correção das bolsas de valores mundiais só está começando. Segundo ele, ¿os mercados devem cair ainda mais até encontrar novos níveis de preços¿. A seguir, os principais trechos da entrevista.

A percepção de risco no mundo está mudando?

Está mudando há algum tempo, por uma série de coisas. Desde junho, havia uma dicotomia entre o comportamento dos mercados de crédito (renda fixa) e os mercados acionários. Nos primeiros, houve elevação significativa dos spreads nos mercados emergentes, nos ¿junk bonds¿ (títulos de alto risco) dos Estados Unidos e nos mercados de derivativos de crédito. As ações, de outro lado, subiam. Nitidamente, essa dicotomia deveria deixar de existir em algum momento. Ou por uma baixa dos spreads de crédito ou por uma correção das bolsas. Eu imaginava que ocorreria uma correção, como está acontecendo. Por causa dos problemas no mercado imobiliário americano, uma série de forças deveria levar a algum ajuste. A primeira delas é que a queda no preço dos imóveis leva a uma redução da riqueza dos consumidores americanos e menos dinheiro disponível para consumo. Isso deveria colaborar com um desempenho mais fraco da economia americana. Em segundo lugar, os bancos estão tendo perdas que forçam uma redução da oferta de crédito. Isso faz com que haja menos consumo, o que diminui os resultados das empresas americanas e, conseqüentemente, o valor de suas ações. O terceiro ponto é o mecanismo de ajuste via perda nas carteiras de investidores, em especial de fundos hedge. Ao terem perdas em suas carteiras de crédito, em particular de crédito imobiliário, eles são forçados a vender outros ativos. Os preços, portanto, têm de se ajustar para baixo, sejam bolsas em geral e moedas e títulos de renda fixa de países emergentes. Esse movimento não é nada surpreendente e deve continuar. Mas o mais provável é que não representa uma mudança de tendência. De outro lado, não é provável que esse ajuste, tão rápido, já tenha terminado. Os mercados devem cair mais antes de encontrar novos níveis de preços. Esses níveis atrairão compradores e o mercado retomará a tendência de alta a partir de um nível inferior. Foi o que aconteceu em vários ajustes nos últimos anos.

Em cada ajuste, o mercado estava em nível mais elevado, o que comprova a tendência de alta. É assim que o sr. vê agora também?

Sim, mas o outro lado é que, justamente porque os preços estão mais altos, os ajustes passam a acontecer em períodos cada vez menores. A tendência de alta dos mercados mundiais começa em novembro de 2002. O primeiro ajuste ocorreu 16 meses depois, o segundo 14 meses, o terceiro 12 meses, o quarto 10 meses depois. Agora já estamos vendo outro, 5 meses após o último. Isso pode sinalizar que estamos perto do fim do movimento.

O que significa o fim desse movimento e por que ele ocorreria?

Teremos de ter uma de duas coisas. Ou uma desaceleração forte da economia mundial, que parece improvável, ou uma crise financeira significativa, que também é improvável, mas tem risco maior do que a desaceleração mundial. Hoje, nenhuma das duas coisas vai acontecer no curtíssimo prazo. Por isso acho que esse movimento, ao terminar, será uma boa oportunidade de compra de ativos.

O setor imobiliário americano ainda tem muito para perder?

Sim. O setor já passou por um ajuste significativo do ponto de vista de novas construções, vendas e estoque de imóveis. Mas não houve ajuste significativo de preços. É isso que, em algum momento, traria novos compradores. A queda da atividade no setor, portanto, ainda não acabou. O segundo ponto tem a ver com as conseqüências dessas quedas. A primeira é a queda nas carteiras dos investidores que têm derivativos de crédito do setor imobiliário. Isso já está ocorrendo. A segunda é que, como parte dessas carteiras estão com bancos e eles estão tendo perdas, há um impacto negativo sobre o potencial de crescimento da economia americana. O terceiro ponto é o contágio via mercado financeiro. Quando os investidores têm perdas em determinados ativos, eles são obrigados a vender outros para compensar essas perdas. Ao fazer isso, empurram para baixo os preços dos ativos. Esse movimento é uma bola de neve.

Ao que parece, o sr. não vê uma crise financeira no horizonte, ao menos no curto prazo.

Acho improvável. Esse movimento provavelmente será temporário. Quando passar, acho que os mercados voltarão a uma tendência favorável. Portanto, acho que é um movimento de geração de oportunidades. Quem se apressar ainda vai passar um pouco de calor e pode se machucar um pouco. Mas só teremos certeza depois de o movimento acabar. Agora está muito no início para sermos taxativos.