Título: Polícia Federal prende 5 acusados de fraudar licitações nos Correios
Autor: Mendes, Vannildo
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/08/2007, Nacional, p. A4

Um dos detidos encomendou gravação em que Maurício Marinho pediu propina, o que deflagrou crise do mensalão

Veja o vídeo do escândalo , BRASÍLIA

Uma quadrilha semelhante à desmontada no escândalo do mensalão, repetindo até mesmo um dos personagens e a estatal atingida pelos desvios, foi desmantelada ontem pelo Ministério Público e pela Polícia Federal, na Operação Selo. O grupo era especializado em fraudar licitações para compra de bens e prestação de serviços na Empresa de Correios e Telégrafos (ECT). Ao todo, foram presas cinco pessoas, sendo três empresários e dois servidores da estatal, e cumpridos 25 mandados de busca e apreensão, em Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro e Pernambuco.

Os prejuízos aos cofres públicos ainda estão sendo calculados, mas podem chegar ¿a dezenas de milhões de reais¿, segundo informou o procurador da República Bruno Acioli. A quadrilha desbaratada sucedeu outra, investigada em 2005, a partir da divulgação de uma filmagem de vídeo na qual o chefe do Departamento de Contratação e Administração de Material da ECT, Maurício Marinho, aparece embolsando R$ 3 mil de propina.

Quem armou a gravação e enviou um interlocutor para conversar com Marinho foi o empresário Arthur Wascheck Neto - preso ontem como cabeça do grupo desarticulado pela Operação Selo. ¿Uma organização criminosa tomou o lugar da que saiu¿, disse o delegado Daniel França, que participou das investigações. ¿Como os traficantes fazem no morro, quando são mortos ou presos, acontece o mesmo no serviço público: uma quadrilha sai, entra outra para praticar os mesmos atos ilícitos no seu lugar.¿

França comparou a corrupção nos Correios a um câncer que ressurge por metástase: ¿Não há como eliminar completamente. Você isola em uma parte e ela ressurge em outra.¿ Por isso, apesar de já terem sido realizadas duas operações desde 2005, não dá para assegurar, segundo a PF e o Ministério Público, que o esquema de fraudes esteja eliminado dos Correios. Além de fraudar as licitações, os membros da quadrilha faziam combinação de preços - cartelização - e escolhiam antecipadamente os vencedores de concorrências.

`GUERRA¿

Segundo Acioli, a corrupção persistiu na ECT como fruto de uma guerra de quadrilha, de olho nos contratos vultosos. A investigação envolve fraudes cometidas no período de 2002 até agora e revelou que há mais de uma organização ativa nos Correios. Por isso, as investigações prosseguem e novas prisões poderão ser feitas. De acordo com a investigação, estão envolvidas mais de 20 empresas fornecedoras de bens ou prestadoras de serviços.

Acioli relata que houve a substituição de pessoas alijadas do esquema na época de Marinho. Wascheck, o mentor da gravação em 2005, é conhecido da polícia desde a década de 90 e já teve sua prisão pedida em outras investigações.

Conforme a PF, ele estaria envolvido em irregularidades desde o governo Fernando Collor e foi investigado na compra de bicicletas superfaturadas pelo Ministério da Saúde, na gestão Alceni Guerra.

Colaborador do antigo Serviço Nacional de Informação (SNI) e ligado a arapongas da Abin, o empresário concentrou forte atuação na ECT como lobista e intermediador junto a um pool de empresários que fraudava licitações.

Marinho, depois de cair em desgraça, virou evangélico e réu colaborador da Polícia Federal e do Ministério Público. Suas delações estão ajudando a desmantelar outras quadrilhas na estatal.

MOBILIZAÇÃO

A operação Selo mobilizou 120 policiais, além de membros do Ministério Público e da Controladoria-Geral da União. Nos Correios, Wascheck atuaria desde 1994 fraudando licitações, por meio de empresas de diferentes personalidades jurídicas. A quadrilha corromperia servidores da estatal para aprovar produtos com especificações abaixo das citadas nos editais. Assim, poderia oferecer os menores preços e vencer a concorrência.

Várias licitações estão sob suspeita. Em apenas uma delas, os Correios gastaram quase R$ 8 milhões para comprar cofres - fora dos padrões de segurança. A baixa qualidade do produto foi comprovada em laudo pericial do Instituto Nacional de Criminalística da Polícia Federal. O esquema atingiria todo tipo de compra dentro da estatal, desde tênis para carteiros, capas, guarda-chuvas, botas e geladeiras.

À noite, os advogados dos presos estavam se informando sobre a acusação aos clientes e hoje devem entrar com pedido de relaxamento das prisões. A operação reabriu a temporada de combate à corrupção na PF, após breve trégua por conta dos Jogos Pan-Americanos, mas desta vez com um novo formato - com a presença de representantes do Ministério Público em todas as fases.

FRASES

Daniel França Delegado da Polícia Federal

¿Uma organização criminosa tomou o lugar da que saiu¿

¿Como os traficantes fazem no morro, quando são mortos ou presos, acontece o mesmo no serviço público: uma quadrilha sai, entra outra para praticar os mesmos atos ilícitos no seu lugar¿

¿Não há como eliminar completamente. Você isola em uma parte e ela ressurge em outra¿