Título: Brasil vai tentar retomar Doha
Autor: Otta, Lu Aiko
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/07/2007, Economia, p. B6

Cúpula Mercosul-UE é chance para retomar o diálogo

À margem da reunião de cúpula Brasil-União Européia, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, deverá encontrar-se com o comissário europeu para o Comércio, Peter Mandelson, numa tentativa de retomar o diálogo sobre a Rodada Doha. Na diplomacia brasileira, Doha continua a ser prioritária mesmo depois do recente fracasso em Potsdam, na Alemanha, quando o G-4 - composto pelos quatro protagonistas da rodada (Brasil, União Européia, Estados Unidos e Índia) - tentou em vão delinear um entendimento.

A saída, avaliam diplomatas, será buscar outro formato de negociação, provavelmente contemplando um grupo maior de interlocutores. O diálogo, que já estava difícil, ganhou no fim de semana mais um complicador: o fim da possibilidade de o governo dos Estados Unidos fechar um acordo sem ter de submetê-lo ao Congresso.

Embora a intenção não seja negociar, o encontro será uma boa oportunidade para restabelecer o diálogo. A reunião de cúpula e o jantar logo após serão ocasiões para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva insistir na tese de que só uma interlocução no mais alto nível político, entre chefes de Estado, será capaz de tirar Doha do impasse.

Na semana passada, ele enviou um duro recado aos países desenvolvidos: sem cortes substanciais na proteção à agricultura, 'não tem conversa'. Em diálogo por telefone com o então primeiro-ministro britânico, Tony Blair, ele ponderou que os europeus não podem negociar como no século 20, defendendo antigos esquemas de proteção à agricultura.

Ontem, Lula voltou à carga. Na comemoração de 50 anos da fábrica da Scania, ele contou que o Brasil, 'pela primeira vez', havia resistido às pressões dos ricos, referindo-se à reunião de Potsdam. 'Fizemos questão de dizer que tinha acabado aquele momento de subserviência. Nós queríamos ser tratados em pé de igualdade.'

ACORDOS BILATERAIS

Após o fracasso de Potsdam, empresários e especialistas em comércio exterior brasileiros insistiram que o Brasil deveria reforçar as negociações bilaterais - como o acordo Mercosul-União Européia. As negociações para isso, avaliam ambos os lados, deverão ser retomadas em setembro ou outubro.

Mas, na avaliação brasileira, a OMC segue sendo mais importante, porque é a única possibilidade de se cortarem subsídios dos países ricos à agricultura. O acordo entre Mercosul e União Européia, avalia o Itamaraty, é mais restrito. Enquanto Doha ataca a proteção à agricultura, o acordo com a UE apenas estabeleceria regras e limites para o comércio de ambos os lados - em tese, abrindo mais espaço para a produção agropecuária brasileira no mercado europeu, mas sem tocar em subsídios. Na visão do Itamaraty, um acerto na Rodada Doha daria uma base mais concreta para as negociações entre Mercosul e União Européia.