Título: Brasil faz reunião para tentar manter unidos os países pobres e emergentes
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/07/2007, Economia, p. B10

Para chanceler Celso Amorim, divisão levará ao fracasso da `Rodada do Desenvolvimento¿

Temendo um racha do mundo em desenvolvimento, o chanceler Celso Amorim apela aos governos para a ¿unidade e mobilização¿ dos países emergentes nas negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC) para fazer frente às pressões dos países ricos. O ministro esteve reunido ontem na sede da entidade com as economias mais pobres do mundo e alertou os embaixadores para a necessidade de que os governos continuem engajados no processo para que a Rodada Doha não seja ¿derrubada¿.

O encontro foi organizado entre o Itamaraty e o G-90, grupo de países africanos, asiáticos e alguns latino-americanos que estão entre as economias mais vulneráveis. Amorim deixou claro que, em sua opinião, a mobilização significa ¿ter certeza de que não há um jogo¿ para dividir o mundo em desenvolvimento. ¿Temos de continuar dialogando entre nós e não aumentar a importância das diferenças de posições, que são menores do que temos em comum. Caso contrário, não teremos uma Rodada do Desenvolvimento¿, afirmou.

Para o chanceler, se os países em desenvolvimento de fato querem uma Rodada favorável a seus interesses, precisam ¿manter a mobilização e a pressão política¿. ¿O diálogo não é apenas com os países em desenvolvimento, mas também com a opinião pública e a consciência do mundo¿, disse.

A Rodada Doha, que já passava por sérias dificuldades, entrou em crise depois que o G-4 (Brasil, Índia, Estados Unidos e Europa) não chegaram a um acordo em Potsdam, no mês passado. Os países em desenvolvimento vêm sofrendo de uma tentação de se dividir nessa fase do processo, o que a diplomacia brasileira quer evitar.

Nas últimas semanas, a OMC vem observando iniciativas e fatos que estão sendo considerados perigosos para a suposta unidade dos países em desenvolvimento. A principal delas foi a decisão de um grupo de economias emergentes, como Chile e México, de apresentar uma nova proposta de cortes de tarifas de importação de bens industriais que vai além do que países como Argentina, África do Sul, Brasil e Venezuela aceitariam.

Além disso, o G-20 (grupo de países emergentes) nem sequer conseguiu chegar a um acordo para assinar uma declaração de apoio à posição do Brasil na reunião de Potsdam.

Para completar, o governo americano vem ¿flertando¿ com alguns países emergentes para que adotem posições mais próximas às da Casa Branca.Não por acaso, um diplomata caribenho interpretou a iniciativa de Amorim de reunir os países pobres como uma tentativa de evitar que haja uma divisão ainda maior no grupo de países em desenvolvimento.

¿Ele queria deixar claro que estará sempre do lado dos países em desenvolvimento¿, afirmou o negociador. Questionado por jornalistas se seu apelo por uma unidade foi atendido, Amorim respondeu que acreditava que ¿todos estavam na mesma onda¿. Mas reconheceu: ¿Não pedi um voto.¿

Embaixadores africanos que participaram da reunião afirmaram que sentiram que Amorim está preocupado que a falta de reuniões e engajamento de ministros nessa fase do processo leve à morte da Rodada, ou um adiamento até 2009. Um diplomata afirmou que o temor era em relação à falta de engajamento dos países ricos, que hesitam em abrir seus mercados agrícolas. No caso dos EUA, a Casa Branca nem sequer tem autorização do seu Congresso para continuar negociando.

Há dois dias, a OMC enviou uma carta aos governos explicando que o processo negociador será retomado apenas a partir do dia 16 de julho, quando mediadores das negociações agrícolas e de produtos industriais apresentarão o que acreditam ser um acordo final.

Os países, então, debaterão os textos até o fim de julho e, em agosto, interromperão seus trabalhos por causa das férias de verão na Europa, sem que haja ao menos uma reunião ministerial. Para Amorim, a responsabilidade por um avanço é também dos países em desenvolvimento. ¿A tarefa para que haja um progresso também é nossa¿, disse ele, que defende a realização de algum tipo de reunião entre um certo número de países. Sua idéia, porém, é de que o encontro não seja apenas entre os membros do G-4. ¿Quanto mais amplo, melhor¿, disse.

Apesar do apelo de Amorim, muitos duvidam que o processo possa estar concluído até o fim do ano, como previsto. ¿Com quatro meses faltando para concluir o ano, poucos acreditam que a Rodada ainda pode ser fechado até dezembro¿, afirmou um embaixador latino-americano. ¿O acordo não será feito em 2007. Mas o mundo pode ficar tranqüilo que um dia concluiremos isso tudo¿, disse um diplomata de Zâmbia.