Título: Plantando soja, milho, colhendo agruras
Autor: Gomes, Fabíola
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/07/2007, Economia, p. B4

Agricultores de regiões diferentes convivem com problemas iguais.

Airton Becker passou os últimos três anos cultivando soja, colhendo agruras e rolando dívidas em Boa Vista do Cadeado, noroeste do Rio Grande do Sul. Ele é um entre centenas de milhares de produtores rurais que sonham com uma seqüência de mais cinco safras cheias como a deste ano, com preços compensadores como os de 2004. A combinação é improvável, tanto pelo clima quanto pelas oscilações do mercado, mas necessária para quitar financiamentos e retomar investimentos.

Levantamento da Federação da Agricultura no Rio Grande do Sul (Farsul) indica que os agricultores gaúchos acumularam R$ 8 bilhões em dívidas, por conta das estiagens de 2004 e 2005, dos preços baixos de 2006 e do câmbio que retira a lucratividade da produção exportada em 2007.

A produtividade média do grão no Estado passou de 27 sacas por hectare em 2004, quando também houve estiagem, para 41,6 sacas por hectare em 2007, quando o clima ajudou. O preço médio da saca caiu de R$ 40 naquele ano para R$ 25 neste, mas andou em R$ 23 em 2006.

A preocupação de Becker, agora, é convencer o banco a transferir para 2012 a primeira das cinco parcelas do custeio da lavoura plantada em 2004. A dívida, que vencia em 2005, teve de ser renegociada por causa da estiagem e deveria ser paga em cinco parcelas anuais, de 2007 a 2011.

A safra colhida em maio foi boa, com produtividade de 40 sacas de soja por hectare, e o grão está em alta no mercado internacional, mas o câmbio levou o lucro. ¿Vamos quitar o custo da lavoura deste ano, e só¿, calcula Becker. ¿A prestação da rolagem de 2005 terá de ser adiada.¿

NA BAHIA

Produtor de algodão da nova fronteira agrícola do oeste baiano, na região do município de Luiz Eduardo Magalhães, o paranaense Roberto Bortoloso, animado com as negociações no exterior, entre 2002 e 2004, e com as perspectivas do que viria pela frente, fez uma série de investimentos. Comprou máquinas, investiu em infra-estrutura. Tudo com empréstimos de bancos públicos.

¿Em 2005, veio o baque¿, conta ele. ¿A queda do dólar fez com que o investimento no plantio, quando o dólar passava de R$ 3, não fosse coberto pela venda, quando o dólar estava em R$ 2,30.¿ O resultado, segundo ele, não poderia ser pior. ¿Fiquei inadimplente com o banco, o que me fez ficar com o nome sujo na praça¿, lembra. ¿Acabei sem crédito e tive de vender antecipadamente minha safra seguinte, para manter as operações.¿ Nova safra, mais prejuízo. ¿Quando negociei a produção, o dólar estava em R$ 2,20. Hoje, na entrega, está em R$ 1,90¿, lamenta. ¿Apesar disso, estou vendendo minha produção do ano que vem antecipadamente, mais uma vez, porque é a forma de eu seguir no negócio.¿

Bortoloso acredita que a situação tende a melhorar. ¿Precisamos apenas que o governo alongue um pouco mais o prazo da dívida¿, diz. A opinião é compartilhada pelo vice-presidente da Associação Baiana de Produtores de Algodão, Sérgio Pitt. Segundo ele, porém, muitos produtores do Estado passam pelo mesmo problema de Bortoloso - e não apenas por causa da baixa na cotação do dólar.