Título: Medo de recessão nos EUA faz dólar atingir o maior valor em 3 meses
Autor: Modé, Leandro
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/08/2007, Economia, p. B1

Moeda americana sobe 2,16% e alcança R$ 1,985; alertas de varejistas americanas preocupam investidores.

O temor de que a crise imobiliária americana jogue a maior economia do mundo em uma recessão voltou com força ontem e derrubou novamente os mercados mundiais. No Brasil, o Índice da Bolsa de Valores de São Paulo (Ibovespa) fechou na mínima pontuação do dia, em queda de 2,90%. O dólar subiu 2,16%, para R$ 1,985, maior valor desde 14 de maio.

Entenda a crise dos mercados

O nervosismo no mercado de câmbio foi tamanho que, pela primeira vez desde setembro do ano passado, o Banco Central (BC) não fez leilão de compra da moeda americana.

O presidente do BC, Henrique Meirelles, disse que a instituição 'não comenta' o valor do dólar. Mas ressaltou que o mercado financeiro do Brasil 'opera com absoluta normalidade'.

Três fatores foram determinantes para a agitação de ontem. A Wal-Mart, maior varejista do planeta, reduziu sua projeção de lucro anual por causa da piora do ambiente econômico nos Estados Unidos. Segundo a companhia, a crise dos imóveis, as taxas de juros mais altas no país e os elevados preços da gasolina prejudicaram a demanda por produtos de casa e vestuário no 2º trimestre. A empresa acrescentou que esses efeitos devem reduzir as vendas também no 3º trimestre.

A Home Depot, maior varejista dos EUA no segmento de decoração e produtos para reforma, anunciou lucro 14,5% menor no 2º trimestre e previu condições difíceis no mercado de casas até o ano que vem. 'Acreditamos que o mercado imobiliário e de artigos domésticos seguirá fraco em 2008', disse o executivo-chefe da companhia, Frank Blake.

As ações da Wal-Mart despencaram 5,1% e as da Home Depot, 4,88%. O Índice Dow Jones recuou 1,57% e a bolsa eletrônica Nasdaq, 1,70%. Na Europa, o Índice FTSE 100 da Bolsa de Londres perdeu 1,2% e o CAC-40 da Bolsa de Paris, 1,6%.

O terceiro fator que assustou os investidores foi a notícia de que o fundo Sentinel Management Group congelou os resgates. O fundo, de US$ 1,5 bilhão, informou que não tem conseguido atender ao volume significativo de pedidos de resgates feitos por seus clientes. 'Pensamos inicialmente que o mercado voltaria a mostrar ordem e imaginamos que nossos clientes não entrariam em pânico. Infelizmente, não foi este o caso', disse, em nota, a instituição.

No mercado interbancário, o dia foi mais calmo. As intervenções do Banco Central Europeu (BCE) e do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) foram consideradas normais pelos analistas. O Banco do Japão teve até de enxugar a liquidez - ou seja, fez operações com objetivo de diminuir o volume de dinheiro disponível no mercado interbancário.

Para o economista Alexandre Póvoa, diretor da Modal Asset, a tensão nos mercados chegou a tal ponto que os fundamentos econômicos passaram a ser secundários. 'Nessas horas, os melhores ativos se desvalorizam.' Foi o que ocorreu ontem com o dólar.

Segundo operadores, a forte alta da moeda americana foi provocada por um tipo de operação conhecida como stop-loss. Ou seja, quando o preço de um ativo alcança um determinado nível, os investidores acionam ordens de venda para conter os prejuízos.

Póvoa avalia que a turbulência está longe do fim e diz que não se surpreenderá se o dólar atingir R$ 2,10. 'Mas não vejo uma explosão das cotações.'

E HOJE?

Newton Rosa, economista-chefe da Sul América Investimentos, também prevê a manutenção das oscilações. 'É difícil saber até onde vai e qual será o desfecho.' O ponto positivo, afirmou, é que 'o momento da economia mundial é benigno, com bom crescimento na Ásia, Europa e nos emergentes'.

Hoje, os analistas estão de olho no Índice de Preços ao Consumidor de julho nos EUA. A expectativa é de alta de 0,1% para o índice cheio e de 0,2% para o núcleo, que exclui alimentos e energia. Ontem, saiu o Índice de Preços ao Produtor, cujo número cheio avançou 0,6% e o núcleo, 0,1%. 'Foi uma boa notícia, que o mercado ignorou por causa da tensão', observou Daniel Gorayeb, economista da corretora Spinelli.

A edição eletrônica do jornal Financial Times alertou que hoje é um dia chave para a turbulência, pois 'é a última chance para investidores (de fundos hedge) apresentarem demandas para resgatar seus recursos no fim de setembro'. Segundo o FT, uma eventual nova onda de vendas pode tornar os mercados 'irracionais'.