Título: 'O Brasil hoje é muito diferente'
Autor: Graner, Fabio
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/08/2007, Economia, p. B5

Para ex-diretor do BC, País pode crescer até mais de 4,6% em 2007

A turbulência internacional não deve ter maior impacto no crescimento econômico em 2007 nem na política monetária do Banco Central (BC). Essa é a visão de Eduardo Loyo, ex-diretor do BC, ex-representante do Brasil no Fundo Monetário Internacional (FMI) e, desde maio, economista-chefe do UBS Pactual para América Latina. Loyo, que conversou ontem com o Estado, diz que a projeção de crescimento para 2007 é de 4,6% e, se vier a ser revista, é provável que seja para cima. Segundo ele, a maior contribuição para o crescimento no Brasil hoje é a demanda doméstica.

TURBULÊNCIA

Houve agravamento das desconfianças em relação a estruturas de crédito montadas em cima do mercado hipotecário, que se alastraram para outros segmentos do mercado de crédito. Vamos viver um período de incertezas até que o cenário se torne mais claro em relação aos riscos financeiros, que não estão ainda totalmente mapeados, e aos impactos da turbulência sobre a economia real americana e mundial. A visão do UBS é que a economia americana vai desacelerar este ano, e ela é anterior a esta turbulência.

EFEITOS GLOBAIS

Depende do impacto no crescimento da economia americana, na economia e no comércio global e no preço das commodities. Os impactos sobre o crescimento da economia americana existirão, mas é difícil dizer qual a magnitude, porque nem a magnitude das causas está clara ainda. O efeito sobre o crescimento de outras economias e sobre o comércio global é mais incerto ainda. Sobre as commodities, existem elementos de sustentação estrutural de prazo mais longo dos preços dos produtos que são importantes na pauta de exportação do Brasil. São efeitos ligados ao crescimento da renda per capita na Ásia, na China, na Índia. Não há razão para achar que o que está acontecendo nos mercados financeiros vai estancar a ascensão em países asiáticos de grande população.

EFEITOS NO BRASIL

Um cenário em que a economia americana desacelera mais fortemente é um cenário em que o comércio do Brasil sofre um pouco mais. Mas o Brasil hoje é muito diferente em termos de encarar um cenário internacional menos favorável. Sempre que enfrentava um cenário externo desfavorável, o País acabava sofrendo um impacto muito maior do que o que vinha de fora, porque havia os mecanismos de ampliação dos choques. A desconfiança se transmitia ao câmbio, do câmbio para a dinâmica da dívida, a dinâmica da dívida gerava desconfiança, e isso voltava ao câmbio, num processo de retro-alimentação. O País tinha um nível de reservas relativamente baixo e uma composição de dívida desfavorável por expor o setor público a um nível de risco cambial importante. E essas duas coisas foram revertidas. O período recente favorável foi bem aproveitado para reduzir essas fontes de vulnerabilidade. O que é particular ao Brasil hoje é um fator de mitigação, e não de ampliação, dos efeitos da turbulência.

CRESCIMENTO

Nossa projeção para 2007 é de 4,6% e, se vier a ser revista, é mais provável que seja para cima. É importante ter em mente que muito do que está contribuindo para o crescimento no Brasil hoje é a demanda doméstica, que se expande a taxas bastante robustas. O comércio internacional é importante, assim como o preço das commodities, mas eu diria que hoje a história do crescimento no Brasil está sendo contada mais aqui dentro do que em escala global

POLÍTICA MONETÁRIA

Na nossa visão, o Banco Central volta em setembro ao ritmo que ele vinha adotando antes das duas últimas reuniões, cortando a Selic em 0,25 ponto porcentual. Essa visão já vem de antes da atual turbulência. Estamos prevendo que o BC fará dois outros cortes de 0,25 até o final do ano. Vejo a virada do ano como um momento em que o Banco Central deveria parar para pensar sobre como administrar qualquer espaço adicional que ele imagine ter para cortar juros em 2008. Quanto ao cenário externo, a não ser em caso de uma deterioração muito mais significativa, não vejo como sendo o grande determinante dos limites que o Banco Central vai enfrentar para cortar juros. Acho que é mais um assunto doméstico. Hoje, a demanda se expande a um ritmo de 5,5% a 6%, que é visto em geral como sendo superior ao ritmo de crescimento potencial. Quanto ao câmbio, que saiu de R$ 1,84 para R$ 2, acho que as pessoas tendem a exagerar os efeitos na inflação. Esses efeitos têm impacto sobre a inflação de 2007 e, no máximo, do início de 2008, e decisões de política monetária agora provavelmente só vão afetar a inflação mais para o final de 2008.