Título: Maior denúncia criminal da história do Supremo foi ajuizada há 17 meses
Autor: Macedo, Fausto
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/08/2007, Nacional, p. A6

Acusação descreve `organização criminosa¿, incluindo políticos e empresários, que teria movimentado R$ 55 mi.

A maior denúncia criminal já levada ao Supremo Tribunal Federal (STF) narra como operou o mensalão no Congresso e trata formalmente de 7 crimes atribuídos a 40 acusados que têm no foro privilegiado seu maior trunfo para escapar ou pelo menos empurrar eventual punição por muitos anos - na máxima corte judicial do País, muitas vezes pela complexidade das causas e o elevado número de réus e testemunhas por eles arroladas, os processos se arrastam.

A denúncia tem um ano e 5 meses. Só ontem os ministros do STF começaram a decidir se a recebem ou não. Subscrita pelo procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, a acusação descreve a ação de suposta organização criminosa dividida em três núcleos, envolvendo políticos, empresários, doleiros, publicitários e outros personagens que teriam movimentado R$ 55 milhões.

Parte desses recursos pode ter sido canalizada para contas de deputados em troca de adesão a projetos de interesse do governo Lula, durante seu primeiro mandato.

O procurador-geral identificou crimes de peculato, corrupção ativa, falsidade ideológica, corrupção passiva, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e formação de quadrilha. Apontou, ainda, em 136 páginas operações que qualificou de desvio de recursos públicos e gestão fraudulenta de instituição financeira. Indicou a conduta dos investigados e as circunstâncias em que teriam ocorrido os delitos.

O primeiro núcleo, denominado de político-partidário, seria composto pelo ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu e ex-dirigentes do PT - José Genoino, então presidente do partido, Delúbio Soares, na época tesoureiro, e Sílvio Pereira, secretário-geral. Para o procurador-geral, a meta desse grupo era ¿garantir a continuidade do projeto de poder do Partido dos Trabalhadores, mediante a compra e suporte político de outros partidos políticos e do financiamento futuro e pretérito das suas próprias campanhas¿.

O segundo núcleo, pelo procurador denominado de publicitário-financeiro, era composto pelo empresário Marcos Valério e pessoas próximas dele, Rogério Tolentino, Cristiano Paz, Ramon Hollerbach, Simone Vasconcelos e Geiza Dias. O objetivo desse grupo seria receber ¿vantagens indevidas¿ de integrantes do governo. ¿Para isso, quando delineada a vitória eleitoral do PT em 2002, Marcos Valério ofereceu os préstimos da sua quadrilha ao núcleo político-partidário.¿

O Ministério Público Federal suspeita que o embrião do mensalão foi inaugurado pelo núcleo publicitário-financeiro na eleição para governador de Minas em 1998, na campanha do senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG). A investigação sobre o início do esquema é alvo de outro inquérito em curso no STF, sob o número 2.280.

VANTAGENS INDEVIDAS

O terceiro núcleo, chamado financeiro, teria sido composto por José Augusto Dumont (falecido), Kátia Rabello, José Roberto Salgado, Ayanna Tenório e Vinícius Samarane. ¿Parceiro de longa data do núcleo publicitário-financeiro na prática de crimes, o Banco Rural também ingressou na organização criminosa em busca de vantagens indevidas de integrantes do governo¿, diz o MPF.

Convencido de que as provas que reuniu, testemunhais e documentais, são suficientes contra os 40 suspeitos, o procurador incriminou um a um. José Dirceu, Genoino, Delúbio e Sílvio Pereira foram enquadrados por corrupção ativa, peculato e quadrilha. Marcos Valério, dono da agência SMPB Publicidade, foi denunciado pelos mesmos crimes e também por falsidade, lavagem de dinheiro e evasão de divisas.

O procurador-geral escreveu: ¿Marcos Valério, diante das claras evidências no sentido de que Delúbio Soares não atuava sozinho no Partido dos Trabalhadores, pois não teria a autonomia necessária para estruturar operações do porte das investigadas nos autos, admitiu que o então ministro José Dirceu, representando a cúpula do PT e como alto integrante do governo federal, estava ciente dos esquemas de repasse de dinheiro estabelecidos com Delúbio Soares, tendo garantido as operações.¿

O procurador destacou no texto que os ministros do STF examinam: ¿Valério, já contando com o apoio operacional dos dirigentes do Banco Rural, ofereceu a sua estrutura a José Dirceu, José Genoino, Sílvio Pereira e Delúbio Soares, além de outros integrantes do governo ou do PT, com a finalidade de desviar recursos públicos e transferir valores não contabilizados para compra de apoio político e pagamento de campanhas eleitorais.¿