Título: Escândalo manteve governo na defensiva por um ano
Autor: Nossa, Leonencio
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/08/2007, Nacional, p. A6

Auge foi a confissão do publicitário Duda Mendonça de que PT lhe pagou serviços eleitorais em conta no exterior

Entre junho de 2005, quando as denúncias sobre o mensalão ganharam as manchetes pelas mãos - ou pela voz - do então deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), e maio de 2006, o Congresso viveu dias agitados, alimentado por três comissões parlamentares de inquérito simultâneas: as CPIs dos Correios, do Mensalão e dos Bingos. Uma denúncia puxava outra, o governo não saía da defensiva - e ali se formou o núcleo das denúncias em que o procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, foi buscar o material para as 40 acusações levadas ao Supremo Tribunal Federal.

Foi uma sucessão de denúncias, heróis e vilões e uma briga pelos holofotes como poucas vezes se viu. No auge, o show na TV começava às 10 da manhã e entrava pela madrugada. Entre desabafos, lágrimas e confissões, muita gente achou que, daquela vez, a corrupção levaria um golpe fatal.

A CPI dos Correios foi a mais consistente das três. Comandada pelo senador Delcídio Amaral (PT-MS) e pelo relator, o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), começou investigando um pequeno episódio de suborno nos Correios e espraiou-se por todo um esquema de cooptação de partidos e de parlamentares pelo Planalto. Teve momentos gloriosos com o depoimento do empresário Marcos Valério, tido como intermediário das propinas, e o não-depoimento do tesoureiro petista Delúbio Soares. O termômetro subiu, no Planalto, com a confissão do publicitário Duda Mendonça de que o PT lhe pagou serviços eleitorais em moeda estrangeira, num banco estrangeiro. Por dois ou três dias Lula roubou a cena, com uma entrevista em Paris na qual admitiu que o que o PT fazia (comprar o voto de parlamentares) todo partido fazia.

Roberto Jefferson, José Dirceu, Heloísa Helena, ACM Neto, Gustavo Fruet, Agripino Maia e uma penca de outros oradores, bons e maus, sucederam-se no jogo de gato-e-rato entre governo e oposição. A 5 de abril de 2006 o relator Serraglio entregou o texto final, pedindo o indiciamento dos figurões José Dirceu e Luiz Gushiken, além de outras 100 pessoas. A investigação de Serraglio foi a fonte principal da peça levada ao STF pelo procurador-geral.

Nascida pelas mãos do governo, para enfraquecer a CPI dos Correios, a do Mensalão não encorpou. Deveria investigar apenas se o esquema do mensalão realmente existia e como funcionava. Enveredou por denúncias contra o governo Fernando Henrique - em especial a de compra de votos para aprovar sua reeleição, em 1997. Numa manobra do governo, a CPI morreu, em novembro de 2005, quando um pedido para prorrogá-la foi rejeitado: teve 23 votos a menos que o necessário. Seu presidente, o senador Amir Lando (PMDB-RO), teve de encerrar os trabalhos, sem relatório final.

Entre as duas CPIs a terceira, CPI dos Bingos, correu em paralelo. Sua fonte foi outra denúncia grave, a que envolvia Waldomiro Diniz, auxiliar do então ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu. Ele teria negociações ilegais com empresários de bingo, entre as quais o pagamento de propinas para aprovar contratos entre a Caixa Econômica Federal e operadoras de bingo e jogos de vídeo. Seu início já prenunciava o futuro: formada a comissão, começaram as férias e ela só retomou ritmo dois meses depois. Dominada pela oposição, passeou pelos episódios da morte do prefeito Celso Daniel em Santo André (SP), de acusações a Antonio Palocci em Ribeirão Preto e convocou até auxiliares diretos de Lula, como Gilberto Carvalho e Paulo Okamotto. Encerrada, foi arquivada e esquecida.