Título: Brasil tenta manter atenção em Doha
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/08/2007, Economia, p. B30

Diplomacia brasileira teme que turbulência nos mercados internacionais esfrie ainda mais negociações na OMC.

A diplomacia brasileira quer evitar que as turbulências no sistema financeiro internacional tirem a atenção dos governos das negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC), que serão retomadas na segunda-feira. O embaixador do Brasil em Genebra, Clodoaldo Hugueney, disse ao Estado que um dos esforços do País nas próximas semanas será manter os governos concentrados na Rodada Doha. 'Há o risco de que os esforços políticos sejam colocados no sistema financeiro internacional.'

Hugueney admite que as turbulências financeiras ainda podem fazer surgir tendências protecionistas em alguns países, o que acabaria endurecendo posições dos vários governos nas negociações da OMC. Pelas previsões da entidade, o comércio internacional terá crescimento menor em 2007 em relação a 2006. Para 2008, a taxa pode ser ainda menor.

Na semana passada, a manutenção de posições protecionistas por deputados americanos e a insistência nos Estados Unidos em criar mais barreiras contra a China levaram o presidente da regional do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) de Minneapolis, William Poole, a alertar que essa atitude pode levar ao colapso da OMC. 'A agenda das negociações de Doha está à beira de um colapso e isso levantaria dúvidas sobre e eficácia futura da OMC.'

No Banco de Compensações Internacionais (BIS, na sigla em inglês), o protecionismo também é visto como um risco. A entidade, considerada o banco central dos bancos centrais, alerta que isso criaria atritos entre governos e alimentaria uma queda no crescimento da atividade produtiva.

Apesar do cenário preocupante, o embaixador do Brasil na OMC tenta mostrar otimismo. 'Assim como há esse lado da moeda e esses riscos, também acho que a instabilidade pode ser uma oportunidade para que os países tomem a decisão de chegar a algum tipo de acordo e mostrar que o sistema multilateral está vivo', afirmou Hugueney.

De fato, muitos negociadores acreditam que a Rodada Doha somente foi lançada em 2001 graças ao clima gerado pelos ataques terroristas de 11 de setembro nos Estados Unidos. Na época, o encontro da OMC ocorreu apenas dois meses depois dos ataques às Torres Gêmeas e, em um sinal de união, os países chegaram a um acordo para lançar a rodada e demonstrar ao mercado que estavam comprometidos com a cooperação internacional.

Hoje, porém, não é apenas a crise financeira que poderá esvaziar os esforços dos países na OMC. Um dos riscos alertados pela entidade é a proliferação de acordos bilaterais. A União Européia já iniciou seus trabalhos de aproximação com Índia e Coréia. O Estados Unidos devem insistir, na semana que vem, em um acordo com os países da Bacia do Pacífico, incluindo Japão e China.

Para completar, tudo indica que o Congresso americano vai aprovar uma nova lei de subsídios agrícolas, que manterá as distorções pelo menos até 2011. Na OMC, portanto, qualquer esforço para concluir a rodada pedindo um corte de 70% nos subsídios americanos teria um efeito de apenas médio prazo.