Título: Uma votação em clima de pastelão
Autor: Costa, Rosa e Scinocca, Ana Paula
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/08/2007, Nacional, p. A16
`Calma, boneca¿, pede um. `Não ficam bem esses trejeitos¿, responde outro...
Um bate-boca dos bons, típico de meninos na saída da escola, com frases valentes e trejeitos teatrais, animou a reunião de ontem do Conselho de Ética. Estava em jogo um assunto sério: se seria aberta ou fechada a votação do processo contra o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). O relator Almeida Lima (PMDB-SE) queria que fosse fechada. O tucano Tasso Jereissati (CE), que fosse aberta.
¿Calma, boneca¿, ironizou a certa altura Tasso, imitando gestos e tons efeminados, quando Almeida Lima tentava apresentar seu relatório. ¿Não ficam bem esses trejeitos no senhor¿, retrucou o relator. ¿V. Exa. não vai, senador Tasso Jereissati, castrar minha palavra e não permitir que eu leia um relatório de cinco laudas.¿
O líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), aproveitou a deixa: ¿Senador Almeida, ninguém quer castrar o senhor, de jeito nenhum. Nem na palavra nem do outro jeito.¿ Tasso, seguro de si, subiu o tom e bateu as mãos na mesa, mas Almeida Lima encarou. ¿Força do direito, sim. Direito da força, não. Se o senhor sabe bater na mesa, eu sei ficar de pé¿, disse ele, e ameaçou caminhar na direção do tucano.
Para tristeza de alguns, a turma do deixa disso entrou em cena e estragou a diversão. Sérgio Guerra (PSDB-CE), Demóstenes Torres (DEM-GO), junto com o deputado João Almeida (PSDB-BA) impediram que os dois medissem forças.
A discussão começou quando Tasso cobrou posição do presidente do conselho, Leomar Quintanilha (PMDB-TO), quanto à votação - se seria aberta ou secreta. Almeida Lima resolveu responder em nome de Quintanilha, mas Tasso bateu na mesa e, dedo em riste, acusou: ¿Deixa de palhaçada, você é um palhaço, você está vendido.¿ Visivelmente perdido, como durante quase toda a sessão, Quintanilha não sabia o que fazer. Deixou a cadeira, consultou os técnicos e suspendeu a reunião.
Ainda assim, o clima não esfriou. Coube ao corregedor do Senado, Romeu Tuma (DEM-SP), pedir calma para que a sala do conselho não se transformasse em um ringue. ¿Calma, gente. Isso aqui vai dar problema de agressão¿, pedia, sem sucesso.
Almeida Lima e Tasso continuaram a bater boca. ¿Seu caráter é altamente deficitário¿, disse o tucano. De bate-pronto, o peemedebista retrucou: ¿Sua estatura não me pressiona nem me impressiona.¿
¿Nem na Câmara de Vereadores de Mossoró (RN) eu vi isso¿, lamentou o líder do DEM, José Agripino Maia (RN). ¿Para a imagem do Senado a cena foi uma beleza¿, emendou Sérgio Guerra. Depois de 20 minutos de sessão suspensa, a reunião do Conselho de Ética foi retomada.
Almeida Lima, que assumiu a defesa de Renan - papel que deveria caber apenas a seu advogado, Eduardo Ferrão -, foi aconselhado, até mesmo por aliados, a recuar de sua estratégia inflamada. Wellington Salgado (PMDB-MG), da tropa de choque de Renan, repassou um telefone celular para o relator. Em seguida, sob nova orientação, ele recuou e aposentou as provocações.
Até então elogiado no papel de presidente do conselho, Quintanilha deixou a boa imagem escapar já nas primeiras horas da sessão. Em vez de comandar, parecia perdido, alheio ao que estava ocorrendo. Nas seguidas ocasiões em que Demóstenes lhe pediu que indicasse o rito de votação dos pareceres, ele se limitava a deixar escapar um sorriso amarelo, como se não entendesse o pedido. No meio dos trabalhos, entregou o comando da sessão a seu vice, Adelmir Santana (DEM-DF).
Outro momento novelesco do conselho ocorreu quando Demóstenes e Wellington Salgado se estranharam. A iniciativa coube ao senador goiano, que repreendeu o colega por ignorar regras do regimento. ¿V. Exa. poderia aprender um pouco, estudar o regimento¿, sugeriu. O outro respondeu: ¿V. Exa. foi mal educado comigo.¿ Ao que Demóstenes replicou: ¿Isso é uma tentativa de chicana que nós temos de abortar agora. A forma do voto do conselho será feita pela maioria.¿ Salgado reconheceu sua rispidez. ¿Senador Demóstenes, fui agressivo, peço desculpas mais uma vez.¿ O outro retribuiu: `Eu também peço desculpas.¿ Levantaram-se e, delicadamente, se abraçaram, trocando tapinhas nas costas.