Título: Concessões de rodovias geram recursos
Autor: Duarte, Moacyr Servilha
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/08/2007, Economia, p. B2

O movimento pela busca de rodovias auto-sustentáveis, que se vem expandindo de forma muito rápida em todo o mundo, ganhou nova dinâmica com a entrada dos Estados Unidos na disputa pelos recursos dos investidores. Em 2005 e 2006 os negócios da área no país envolveram apenas US$ 7 bilhões, mas para os próximos anos a expectativa é multiplicar esse valor por 100 ou mais, apesar das naturais resistências de políticos e de usuários.

Duas motivações estão conduzindo os Estados e as prefeituras norte-americanas a adotarem a concessão à iniciativa privada. A primeira é a mesma dos demais países que fizeram essa opção: a percepção de que os recursos tributários não são mais suficientes para financiar a adequada manutenção, a ampliação e a modernização de sistemas rodoviários, por causa do aumento de despesas públicas com educação, saúde, segurança, aposentadoria e justiça. Só a manutenção das rodovias, pontes e túneis no país, feita de forma incompleta, como mostrou o recente caso da ponte do Rio Mississippi, absorve anualmente entre US$ 132 bilhões e US$ 155 bilhões do orçamento público, exigindo novas fontes de financiamento, para evitar sua deterioração.

O segundo motivo é, no entanto, menos presente em outros países: a descoberta que rodovias, túneis e pontes são ativos valiosos, que podem ser uma nova fonte de recursos para as necessidades que a comunidade espera ver atendidas pelo poder público. Assim, os governos estaduais e as prefeituras vêm oferecendo trechos da infra-estrutura rodoviária a investidores dispostos a pagar uma soma considerável para ficar com o direito de explorar o bem, cobrando pedágio. Em alguns casos o processo começa até por sugestão ou iniciativa destes investidores, entre os quais se encontram principalmente empresas da Europa, onde existe uma tradição de rodovias concedidas, e também da Austrália e do Brasil.

Entre nós, o Estado de São Paulo foi pioneiro nessa modalidade de cobrar pela concessão do bem, ao licitar, durante a gestão do saudoso governador Mário Covas, as rodovias estaduais, fixando tarifas e definindo a licitação pela maior oferta recebida, o chamado ônus da concessão. Nos Estados Unidos valores significativos têm sido arrecadados nessas concessões, o que possibilita importantes investimentos do poder público para atender a outras carências da comunidade.

Hoje, 26 Estados no país contam com rodovias pedagiadas, numa extensão total de 25 mil quilômetros, número que deve crescer substancialmente, além de ocorrerem transferências onerosas da exploração pelo Poder Público para concessionárias privadas. Os governos estaduais e municipais nos Estados Unidos prevêem obter US$ 1,7 trilhão com a concessão de rodovias, e outros bilhões de dólares com metrôs, redes de tratamento de esgoto, portos, oleodutos e aeroportos.

O interesse por esse programa de concessões é cada dia maior. Assim, o Goldman Sachs Group Inc., a maior empresa de investimentos dos Estados Unidos em valor de mercado, levantou US$ 6,5 bilhões para seu primeiro fundo de investimentos em rodovias pedagiadas, aeroportos e outros projetos de infra-estrutura, o GS Infrastructure Partners. O dinheiro veio do próprio Goldman e de fundos de pensão, bancos e companhias de seguro.

O Goldman é uma das 48 firmas que registraram interesse na concessão da Pennsylvania Turnpike, uma rodovia de 864 quilômetros, construída há 66 anos e deteriorada. Apesar de seu mau estado, o governador da Pensilvânia espera obter entre US$ 3 bilhões e US$ 10 bilhões por essa concessão, importância que complementará o dinheiro do Estado para a área de transportes. Outros 12 Estados norte-americanos já têm programas de concessão de rodovias pedagiadas, abrangendo um total de 4.344 quilômetros.

O banco Credit Suisse estima em mais de US$ 250 bilhões o valor das rodovias já pedagiadas dos Estados Unidos que poderiam ser objeto de concessão a empresas privadas. Só a New Jersey Turnpike, teve seu valor estimado em US$ 20 bilhões pelo banco UBS, mas ainda não há um projeto para a concessão.

Recentemente a Brisa Auto-Estradas, de Portugal, e a CCR Companhia de Concessões Rodoviárias, do Brasil, adquiriram a concessão da rodovia pedagiada Northwest Parkway, de 15 quilômetros, no Colorado, por 99 anos, em uma negociação avaliada em US$ 603 milhões, incluindo dívidas de aproximadamente US$ 503 milhões e um investimento de US$ 60 milhões para ampliar a rodovia até um aeroporto metropolitano próximo. As duas empresas esperam depois se credenciar para uma expansão de outros 24 quilômetros da rodovia, que estão em fase de planejamento.

Assim, os Estados Unidos passam a compor com a Índia (175 projetos no valor de US$ 50 bilhões) e a China (o maior projeto de rodovias pedagiadas do mundo) o trio de países mais atrativos para investidores do setor. No Brasil, o programa federal de concessões de rodovias abrange apenas sete lotes e suas regras já foram trocadas três vezes, o que o torna internacionalmente uma das opções menores, embora o País necessite urgentemente ampliar e modernizar sua rede rodoviária. Se não tivermos regras que inspirem a devida confiabilidade ao longo dos anos e a disposição de cumpri-las, corremos o risco de ficar sem os recursos dos principais investidores, que hoje dispõem de grandes oportunidades nos Estados Unidos, na China, na Índia, no México e em outros países.