Título: Decreto de Lula criou disputa por terra, diz Jungmann
Autor: Marchi, Carlos
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/08/2007, Nacional, p. A6

Deputado diz que quilombolas vão brigar pelo mesmo orçamento do Incra para assentar os sem-terra

O reconhecimento de terras de comunidades quilombolas cria sério impasse institucional, afirmou o deputado Raul Jungmann (PPS-PE), ex-ministro do Desenvolvimento Agrário no governo FHC. Para ele, a regulamentação feita pelo governo Lula para reconhecer os territórios quilombolas estabelece uma disputa orçamentária entre os potenciais remanescentes de quilombos e os sem-terra. ¿É um orçamento só para assentar sem-terra e quilombolas¿, questionou.

Para a deputada Maria do Rosário (RS), vice-presidente nacional do PT, ¿o cobertor orçamentário pode ficar curto, mas a concessão de terra a quem não a tem é uma obrigação do Estado¿. De acordo com ela, são tão legítimas as reivindicações feitas pelos sem-terra como as dos quilombolas. Ontem, o Estado mostrou que 3.524 comunidades reivindicam 25 milhões de hectares que seriam de antigos quilombos, uma área do tamanho do Estado de São Paulo.

DOIS ERROS

Jungmann diz que a regulamentação do artigo 68 das Disposições Constitucionais Transitórias, que prevê o reconhecimento de antigos quilombos, foi equivocada nos governos FHC e Lula. O governo passado definiu que o laudo antropológico para o reconhecimento de antigos quilombos e o assentamento das comunidades deveria ser feito pelo Incra, que, segundo o deputado, não tem conhecimento em antropologia.

Depois o governo FHC transferiu o laudo para a Fundação Palmares, deixando a desapropriação e o assentamento com o Incra. ¿Houve um descasamento, porque o mérito passou a ser julgado na fundação, mas o orçamento que custeia a operação era do Incra¿, disse. O erro do governo Lula, segundo o deputado, foi ampliar o conceito de direito dos quilombolas. ¿Antes se exigia a posse continuada da terra pelos quilombolas, mas o governo Lula acabou com isso e tornou qualquer terra passível de questionamento.¿

Além disso, questiona Jungmann, a Fundação Palmares não tem contraditório na fixação do mérito: como ela defende direitos da população negra, estará sempre simpática a conceder as solicitações das comunidades negras que se auto-intitulam quilombolas. ¿Há casos em que a ocupação continuada está provada, como as comunidades do Rio Trombetas, no Pará, e do Rio das Rãs, no oeste da Bahia. Mas um número grande dos casos que estão surgindo agora não comprova ocupação continuada¿, diz Jungmann.

Maria do Rosário registra que o tema da reparação das comunidades negras é muito recente: ¿Mas a dívida que existe é tão grande que o que está sendo assegurado aos negros será sempre menos que o justo.¿ Ela afirmou que secularmente a responsabilidade do Estado ¿tem sido muito negligenciada com as populações negras¿.

FRASES

Raul Jungmann (PPS-PE) deputado

¿É um orçamento só para assentar sem-terra e quilombolas¿

Maria do Rosário (PT-RS) deputada

¿O cobertor orçamentário pode ficar curto, mas a concessão de terra a quem não a tem é uma obrigação do Estado¿