Título: Presidente defende candidato da coalizão
Autor: Rosa, Vera e Tosta, Wilson
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/09/2007, Nacional, p. A8

No Congresso Nacional do PT, Lula deixa aberta possibilidade de legenda apoiar nome que não seja o de um petista para sua sucessão, em 2010

Em um recado às tendências internas que pregam que o PT decida que obrigatoriamente terá candidato próprio à sucessão presidencial em 2010, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu ontem, em seu discurso no 3º Congresso Nacional da legenda, que a candidatura seja da coalizão que o apóia - e, embora não o dissesse, não necessariamente a de um petista.

Lula deixou aberta, assim, a possibilidade de a legenda apoiar candidato presidencial que seja de fora do partido, mas, ao mesmo tempo, não descartou a hipótese de ser um petista o postulante da coligação, o que ficaria para ser decidido mais adiante. O presidente falou da sucessão após longo elogio ao seu governo, afirmando que é necessário que suas iniciativas tenham continuidade.

'Queridas companheiras e companheiros, já foi dito que esses oito anos de nosso governo, nossos dois governos, não podem ser um intervalo progressista entre governos conservadores', afirmou. 'Disse e reafirmo que passarei a faixa presidencial ao meu sucessor no dia 1º de janeiro de 2011. Lutarei, no entanto, para que o futuro presidente seja alguém identificado com nosso projeto, capaz de dar continuidade e profundidade à obra que iniciamos', continuou. 'O PT e seus aliados têm nomes, mas sobretudo idéias, para ter uma candidatura própria.' A declaração de Lula foi dada no trecho lido do discurso.

O presidente afirmou ainda que, para chegar com força às eleições municipais de 2008 e às eleições gerais de 2010, o PT terá que aprofundar seu debate político, reformar as relações com movimentos sociais e apoiar 'de modo cada vez mais criativo' o governo. 'Quando tiverem de fazer críticas, sejam manerados (moderados)', pediu, provocando risos na platéia de delegados e convidados, no Centro de Exposições Imigrantes. 'Para isso, será importante que o PT se renove, como soube fazer ao longo de toda a sua história, que seja um líder, que não sacrifique suas idéias gerais e seu projeto coletivo aos interesses de grupos.' Também pediu que a democracia interna petista não seja 'pretexto para uma luta permanente' que fragilize o partido e se torne incompreensível para a sociedade.

DEBATE

Depois do discurso, o presidente do PT, Ricardo Berzoini, concordou com Lula. 'O presidente falou aquilo que eu tenho dito sistematicamente: o PT tem vocação para ter candidato, é natural que tenha candidato, mas não pode ser arrogante nem presunçoso na relação com outros partidos', declarou. 'Deve produzir alternativas para discutir com a base do governo quando chegar a hora. E a hora não é agora', alertou Berzoini. 'Se chegar forte a 2010, tem todas as condições de ter candidato próprio.'

Para o ministro da Justiça, Tarso Genro, Lula disse que o partido deve considerar a possibilidade de ter candidato próprio, mas deve conversar sobre a proposta com seus aliados e apresentar candidatos viáveis. 'Agora, ninguém defende que o PT tenha a exclusividade da verdade, nem a exclusividade da candidatura. Isso tem que ser negociado com os aliados', argumentou o ministro. 'Eu defendo que o PT tenha um candidato, apresente para os seus aliados e discuta com eles a melhor possibilidade. Inclusive, pode aparecer fora do PT um melhor candidato. O PT tem que considerar essa possibilidade, sim.'

O secretário-geral da Presidência, Luiz Dulci, seguiu raciocínio semelhante ao de Berzoini. 'Qualquer que seja a decisão tomada agora, não tem conseqüências práticas', declarou. 'O PSB lançou Ciro Gomes, é perfeitamente natural.' Segundo ele, é provável que socialistas e peemedebistas decidam ter candidato em 2010. 'É um ótimo sinal de vitalidade dos partidos da coalizão.'

Na véspera, o dirigente Valter Pomar, da Articulação de Esquerda, defendeu que o PT tenha candidato em 2010. Ele lembrou que a próxima eleição presidencial trará situação nova, pois, pela primeira vez desde 1989, Lula não concorrerá. 'O PT obrigatoriamente terá que ter candidato', afirmou. 'Obrigatoriamente. Um partido com a força do PT, com a importância do PT, vai ter candidato, como tivemos. Essa pergunta - O PT terá candidato?- não foi feita em 89, 94, 98, 2002 e 2006. Por que está sendo feita agora?'

Na prática, o primeiro teste para medir grau de unidade entre os parceiros da coalizão serão as disputas municipais de 2008. 'Não vamos dar moleza para Ciro Gomes', avisa o deputado Jilmar Tatto, um dos vice-presidentes do PT.

O ministro da Defesa, Nelson Jobim (PMDB), é outro que causa ciúmes. Nas rodas petistas, é tratado como a 'noiva' da Esplanada. A hostilidade começou em repúdio à diminuição da cota petista no governo, já que, ao assumir a tarefa de resolver a crise área, Jobim desbancou Waldir Pires (PT). 'Todos reconhecemos a importância de manter a unidade, mas o PT precisa ter cara própria no governo', diz Tatto.

RUSGAS

A questão sobre o candidato a presidente do PT, ou que venha a ser apoiado pelo partido, não é o único motivo de insatisfação. Os problemas passam ainda pela perda de cargos no governo e pelos rumos da política monetária.

Até hoje setores da sigla não se conformam com a manutenção de Henrique Meirelles no comando do Banco Central. 'É um erro brutal', diz Pomar.

Cotado para a corrida ao Planalto, o governador da Bahia, Jaques Wagner, admite o desgaste no relacionamento entre o presidente e seu partido, mas considera esse estágio natural no jogo do poder. 'Lula e o PT são indissociáveis, mas têm tarefas e missões que, em determinados momentos, são diferentes', argumenta. 'Se não houver compreensão, podem se chocar e, por isso, o PT precisa entender a importância da coalizão.'

A opinião é compartilhada pelo presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (SP), da tendência Movimento PT. 'Quando falamos numa candidatura em 2010, isso não significa que vamos impor um nome. Significa que vamos respeitar a coalizão, mas também que temos consciência.'

Amigo de Lula e integrante do antigo Campo Majoritário, o presidente do PT paulista, Paulo Frateschi, afirma que a direção da legenda precisa se reestruturar para ter condições de 'diálogo especial' com o governo. 'Não podemos aceitar recados nem intermediários e muito menos jogar água no moinho dos adversários.'