Título: Julgamento inibe caixa 2, dizem parlamentares
Autor: Lopes, Eugênia e Nossa, Leonencio
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/09/2007, Nacional, p. A10

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de abrir processo penal contra 40 políticos, empresários e assessores acusados de envolvimento com o esquema do mensalão deve criar novos parâmetros de ética e controles mais rígidos de financiamento de campanha nas eleições futuras. Os parlamentares apostam que, já nas eleições municipais do ano que vem a cautela com o eventual uso de caixa 2 será muito maior.

'Não tenho dúvidas de que os candidatos vão ter muito mais cuidado', diz o senador Delcídio Amaral (PT-MS). 'O ruim é ter a decisão do Supremo e não ter feito a reforma política até hoje.' Em tramitação há mais de uma década no Congresso, nem a reforma política nem a eleitoral saíram até hoje do papel. A Justiça entrou mais uma vez em campo, criando novos balizamentos de comportamento para os políticos, principalmente no que diz respeito ao uso de dinheiro público.

Para o deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR), a decisão do Supremo é profilática não apenas para os políticos. O tucano argumenta que, no julgamento da denúncia do mensalão, os banqueiros e os empresários acusados acabaram enquadrados no maior número de crimes, sujeitos a altas penas. 'Isso vai assustar quem acha que ter relações com políticos é um caminho para fazer bons negócios', aposta Fruet. 'É claro que a decisão do Supremo tem um caráter didático que vai inibir o uso de caixa 2. É um alerta claro para a classe política.'

HÁBITOS CULTURAIS

Apesar disso, o tucano não vislumbra mudanças profundas no comportamento dos políticos a curtíssimo prazo. 'A tendência é achar que com as leis vão ser mudados hábitos culturais. É cedo e difícil dimensionar o que a decisão do Supremo vai provocar no processo eleitoral e também nas estruturas de campanha', argumenta. 'Mas é claro que a decisão do STF põe um freio de arrumação, apesar de ser difícil quebrar toda essa engrenagem de anos nas estruturas das campanhas.'

O deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR) está convicto de que a decisão do Supremo servirá de parâmetro para o estabelecimento de regras mais rígidas, para inibir o uso de caixa 2 em campanhas eleitorais. 'No limite, pode-se dizer que houve uma fraude em uma eleição presidencial', afirma Serraglio, que foi relator da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Correios, que investigou desvio de recursos públicos.

Em depoimento à CPI, o publicitário Duda Mendonça admitiu ter recebido R$ 10 milhões do empresário Marcos Valério, apontado como operador do mensalão. O dinheiro seria o pagamento de seus serviços na campanha do PT nacional em 2002, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se elegeu para o primeiro mandato. 'Nem todos os recursos que vimos passar pelo valerioduto foram para o mensalão. Uma parte foi, enquanto outra foi para o sistema do Duda Mendonça, que pode ter alimentado o caixa 2. São recursos públicos que foram desviados para comprar parlamentares ou para financiar campanhas eleitorais', acusa Serraglio. 'Depois da decisão do Supremo, os políticos com certeza vão ter mais medo de fazer caixa 2', avalia.

JOGO DURO

Para o deputado José Eduardo Martins Cardozo (PT-SP), o comportamento dos políticos em relação ao financiamento de campanha e ao uso de caixa 2 começou a mudar desde as últimas eleições. 'Mas é um processo que leva algum tempo. Cada vez mais a Justiça aperta em relação à prestação de contas e ao fim de caixa 2', conta. 'A tendência agora, depois da decisão do Supremo, é endurecer o jogo', diz.