Título: Serra pretende fazer caixa com depósitos judiciais
Autor: Amorim, Silvia
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/09/2007, Nacional, p. A12

O governador José Serra (PSDB) iniciou na semana passada uma nova ofensiva para engordar o caixa do Estado e pôr em prática suas promessas de campanha. De olho em uma conta administrada pelo banco Nossa Caixa com cerca de R$ 1,4 bilhão em depósitos judiciais e administrativos, Serra pediu à Assembléia Legislativa autorização para repassar R$ 1 bilhão ao Tesouro estadual.

O dinheiro, segundo o projeto de lei, será aplicado na construção e reforma de fóruns e estradas vicinais, informatização do Judiciário e do Ministério Público, pagamento de precatórios, e, de forma genérica, em investimentos nas áreas de segurança pública e administração penitenciária.

Na prática, o que Serra pede é o uso antecipado de um dinheiro depositado em juízo por autores de ações contra o Estado e que não pertence, até que haja sentença nesse sentido, ao governo. Em geral, são contribuintes questionando a cobrança de impostos, taxas ou multas administrativas. ¿Em vez de deixar de pagar o tributo, correndo o risco de ter de ressarcir o Estado de uma só vez se perder a ação, muitas pessoas preferem fazer o pagamento do tributo em juízo e, se ganhar a ação, receber o dinheiro de volta¿, explica o tributarista Anis Kfouri.

A proposta encontra respaldo na Lei 11.429, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em dezembro de 2006 e que regulamenta o uso desses depósitos pelos Estados.

LIQUIDEZ

Embora seja constitucional, Kfouri faz um alerta quanto ao impacto da medida na liquidez dessas reservas. ¿Os depósitos foram criados para resguardar o direito de receber do possível credor sem ter que entrar na fila de precatórios. A partir do momento em que você retira dinheiro dessa conta fica uma dúvida: será que o Estado vai conseguir restituir o contribuinte com a agilidade de hoje quando perder uma causa?¿, questiona o advogado. ¿Me preocupo, porque o Estado nem sempre se mostrou um bom pagador.¿

A Secretaria de Estado da Fazenda diz que a restituição do depósito estará assegurada por meio de um fundo. ¿Esta medida revela-se da mais alta importância para o aperfeiçoamento da utilização dos valores relativos aos depósitos judiciais e administrativos, consistindo, simultaneamente, na garantia da restituição e na geração de benefícios e vantagens à sociedade¿, diz a justificativa enviada por Serra aos deputados.

Para garantir esse pagamento, o projeto de lei prevê que o governo pode sacar, no máximo, 70% dos valores depositados nessa conta referentes aos processos nos quais o Estado de São Paulo seja parte. Com o restante deverá constituir um fundo para pagar as restituições determinadas pela Justiça. O governo se compromete ainda a recompor essa reserva sempre que estiver abaixo de 30%.

IMPACTO

Essa não é a primeira vez que Serra busca na Nossa Caixa recursos para reforçar os cofres do Estado. Em abril, o tucano sacou R$ 2,1 bilhões do banco em troca da transferência das contas do funcionalismo do Santander para o banco estadual. Na ocasião, o mercado financeiro reagiu e as ações da instituição despencaram.

O projeto encaminhado na última sexta-feira à Assembléia não faz referência a eventuais impactos da medida nas ações da Nossa Caixa. A Comissão de Finanças e Orçamento da Assembléia aprovou anteontem convite para que o secretário da Fazenda, Mauro Ricardo Costa, vá à Casa explicar o projeto. O governo quer aprovar a proposta até o fim deste ano.

Nessa corrida por recursos, Serra já aprovou um empréstimo internacional de US$ 450 milhões para o metrô e ampliou em R$ 4 bilhões o endividamento do Estado.