Título: O papel do etanol na onda verde mundial
Autor: Biagi Filho, Maurilio
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/09/2007, Economia, p. B2

Não é fácil enumerar as vantagens e os benefícios gerados por seus próprios produtos. Corremos o risco da arrogância. No caso do setor sucroalcooleiro, há muito o que falar. Tendo mais de 50 anos de experiência, reservo-me o direito de comprovar minhas teorias com argumentos oferecidos por respeitadas pessoas de outras áreas. Como os do nobre embaixador Sérgio Amaral no seu artigo A nova onda verde, publicado no Estado em 18 de julho. De acordo com ele, há algumas razões para avançarmos no desenvolvimento de ações que busquem proteger o nosso planeta da inevitável elevação de temperatura. Uma delas é o aumento do uso de combustíveis renováveis, como o etanol. Quanto mais tecnologia e produção tivermos, maior será a nossa contribuição para evitar essa catástrofe eminente. Dias depois, o jornalista Alberto Tamer lembrou bem aqui no Estado que a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO), antes favorável ao etanol, agora mudou. 'Por que será?', indaga Tamer. Diz a FAO que o combustível limpo ameaça o preço dos alimentos. Ele nota a estranha coincidência: divulgar sua posição justamente pouco antes da reunião sobre o tema, em Bruxelas, onde Lula foi o principal convidado. 'Isso confirma apenas que o lobby da Opep ganha força e agressividade. Afinal, seus integrantes embolsam dezenas de bilhões de dólares vendendo por US$ 74 o barril de petróleo que produzem por US$ 10. É mentira deslavada!' Para o jornalista, Lula reagiu à altura: 'Por que não falaram no aumento do preço dos alimentos quando o petróleo pulou de US$ 28 para US$ 74?' Ninguém respondeu, porque não tinha o que responder. Os preços subiram antes. Nos últimos 12 meses, os preços de todas as commodities agrícolas, metálicas e minerais explodiram! E o etanol ainda nem havia entrado no mercado! A jornalista Sonia Racy, em sua coluna Direto da Fonte, do dia 4 de agosto, informa que a missão empresarial que acompanhou o presidente ao México, à América Central e ao Caribe entregou a ele documento que alerta para o risco de a produção e a comercialização do álcool combustível passar para a responsabilidade da Petrobrás, como vem sendo articulado nos bastidores do governo. Sonia assinala que, segundo os empresários, 'a primeira reação será a fuga em massa dos US$ 17 bilhões já aplicados por dezenas de investidores estrangeiros, que não suportariam ver sua atividade controlada pelo Estado'. Vai além: 'Em seguida, cessará o fluxo de capital externo para o setor sucroalcooleiro.' E o Estado, em seu editorial (27/8, A3) prevê o mal que se trama: 'Está pronto o anteprojeto que amplia as competências da Agência Nacional do Petróleo (ANP), estendendo seu poder de regulação e fiscalização à produção, comercialização, armazenagem e transporte do etanol. O projeto contém tantos exageros que pode causar graves prejuízos para a atividade sucroalcooleira e para o País.' A relação entre esses comentários pode não parecer muito óbvia para muitos. Mas vejo uma relação direta de causa e efeito. De um lado, o Brasil tem tecnologia avançada na produção de um combustível barato, renovável e ecologicamente correto; de outro, tem a infeliz idéia de o Estado apropriar-se dessa conquista da sociedade. O efeito seria devastador. Todo o avanço obtido com o fruto do mercado livre seria abortado em razão de uma estrutura monopolista oferecida pelo Estado burocrático. Em vez de avançarmos na crescente evolução do etanol com a abertura de novos mercados, aumento do consumo e conseqüente redução da emissão de poluentes, estaríamos restringindo tudo o que conquistamos em 30 anos de pesquisa e muito investimento por parte da iniciativa privada. Se essa idéia do governo se concretizar, entregaremos outro tesouro brasileiro nas mãos do Estado. A História mostra que o Brasil não tem muita sorte na escolha de governos eficientes, que administrem corretamente seus recursos e tecnologias. Essas atitudes inibiriam o desenvolvimento tecnológico, produtivo e de consumo, nos jogando na contramão de uma tendência mundial. O Brasil, os demais países e o planeta teriam muito a perder com essa ação antievolucionista do governo. Diante de tantas ingerências, não vamos esperar para ver o que acontece. Vamos agir, preservar nossas conquistas e lutar para que o País continue modelo na solução de fontes de energia que respeitam o meio ambiente. *Maurilio Biagi Filho, CEO da Maubisa Consultoria, é membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República