Título: As favelas das Marginais
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Fonte: O Estado de São Paulo, 14/09/2007, Notas & Informações, p. A3

A Prefeitura de São Paulo anunciou a remoção de pelo menos 20 mil famílias que habitam 19 favelas instaladas nas alças das pontes das Marginais do Tietê e do Pinheiros. A iniciativa demonstra uma clara mudança das prioridades da política municipal de reurbanização de favelas, que deixa, finalmente, de considerar apenas as concentrações de barracos situadas em morros e regiões de mananciais para também cuidar das vizinhanças das pontes, onde barracos se multiplicam e seus moradores se expõem a atropelamentos, incêndios e altos níveis de poluição.

O prefeito Gilberto Kassab pretende usar nesse projeto parte da verba de R$ 1,2 bilhão destinada pelo governo federal para a urbanização de favelas na capital, como parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Há dias, a administração municipal reforçou em R$ 8 milhões o orçamento para as remoções em áreas de risco.

O programa de remoção das favelas das Marginais foi planejado com base em estudo feito pela organização internacional Aliança de Cidades e financiado pelo Banco Mundial. Conforme o levantamento, várias das 19 favelas das Marginais foram erradicadas mas, por falta de fiscalização e de uma política habitacional eficaz, renasceram nas vizinhanças das pontes, algumas tendo crescimento explosivo. Na Ponte Julio de Mesquita Neto, por exemplo, a favela foi retirada e reocupada duas vezes nos últimos dez anos.

Há cinco anos, atendendo ao Ministério Público Estadual (MPE), a Prefeitura assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) que dá prioridade à remoção de invasões nas áreas de 11 pontes na Marginal do Tietê e de 8 na Marginal do Pinheiros. Na maior parte dessas favelas não há coleta de lixo, nem fornecimento de energia elétrica e água encanada. Muitos barracos foram erguidos em áreas de risco, a poucos centímetros da faixa de asfalto, onde o trânsito é veloz e intenso.

Os moradores removidos poderão ingressar nos programas habitacionais do governo do Estado e da Companhia Metropolitana de Habitação (Cohab). Enquanto aguardam pela moradia, as famílias receberão uma bolsa-aluguel no valor de R$ 300,00.

Segundo o secretário municipal da Habitação, Orlando Almeida, os moradores que desejarem poderão receber imediatamente verba de R$ 8 mil para a aquisição de outro imóvel ou de R$ 5 mil para retornar às suas cidades de origem.

Mas é preciso cuidado para que não haja desperdício de dinheiro público. Favelados entrevistados nos últimos dias por jornais e emissoras de televisão declararam a intenção de usar as indenizações anunciadas para erguer novos barracos em outras áreas da cidade.

Se não houver um controle eficaz, com esse programa de ajuda a Prefeitura estará simplesmente transferindo favelas de um lugar para outro, sem resolver um problema que é cada vez mais grave.

A população favelada de São Paulo aumentou 38% nos últimos quatro anos, passando de 290 mil famílias (1,3 milhão de pessoas) para 400 mil famílias, com cerca de 2 milhões de pessoas. Em boa parte, o crescimento é vegetativo, como parece indicar o fato de o número de favelas ter baixado de 2.018 para 1.538, desde 2003.

Mas também é fato que algumas concentrações de submoradias se uniram, num processo de conurbação, e incharam, com a verticalização de barracos. Ocorre, ainda, que as obras de reurbanização das favelas atraem novos moradores, que migram de outras áreas invadidas em busca de melhorias como redes de água e esgoto e iluminação. Os ¿migrantes¿ constroem seus barracos nas áreas próximas das favelas urbanizadas e esperam 5 anos. Completado esse prazo, passam a ter, conforme o Estatuto das Cidades e o Plano Diretor de São Paulo, o direito de regularizar a posse do imóvel.

Assim, tornam-se proprietários de uma casa na favela sem ter de entrar nas filas intermináveis de candidatos a uma moradia nos conjuntos habitacionais populares.