Título: Absolvição provoca indignação e raiva
Autor: Domingos, João
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/09/2007, Nacional, p. A8

Faixa incentiva motoristas a protestarem contra Renan

Na noite de quarta-feira, no balcão do Bar do Gê, na Barra Funda, um grupo de amigos - a maioria deles pequenos comerciantes - resolveu fazer alguma coisa para protestar contra a absolvição de Renan Calheiros pelos seus pares no Senado - ocorrida horas antes. Mas, fazer o quê?

Mário Tadeu, o Chacrinha, dono de escritório de contabilidade, sugeriu uma faixa. O grupo gostou da idéia e, na tarde do dia seguinte, a faixa balançava no alto da porta do bar, na esquina das Ruas Cruzeiro e Baronesa de Porto Carreiro, com as frases: 'Renan... Você não tem vergonha de ser brasileiro? CPMF e Renan - vergonha. Se você está contra, buzine'.

A maioria dos motoristas que liam buzinava contra a absolvição. 'Foi um buzinaço. De cada dez, oito metiam a mão na buzina', contou o mecânico José Furaco.

A faixa foi retirada à noite, a pedido dos vizinhos, incomodados com tanta buzina, mas voltou na sexta-feira.

Essa foi uma das várias manifestações de descontentamento que a notícia da absolvição do senador causou em São Paulo. Ainda na noite de quarta-feira, os participantes do Movimento Grande Vaia, que tem como objetivo principal o combate ao governo do presidente Lula e ao PT, também começou a se articular. Por meio da internet, acertaram um ato de protesto - ocorrido ontem à tarde, na Avenida Paulista, esquina com a Pamplona.

Eram quase 100 pessoas com carro de som, apitos, nariz de palhaço e cartazes pedindo ética, fim do voto secreto e da impunidade.

Em vários lugares a decepção ficou nítida como uma cicatriz. Lucas D'Agostini, estudante do ensino médio, contou que em sua classe o que mais ouviu foram manifestações de desalento. 'Eu, que achava que os políticos já tinham chegado ao fundo do poço, vi que podem se superar e ir mais fundo', disse.

No site de relacionamento Orkut, a comunidade Fora Renan agregou 1.493 indignados participantes. No centro da cidade, num restaurante a quilo, o professor Jair Assumpção foi peremptório: 'Absurdo! Absurdo! O pior é que percebo uma decepção muito grande, um desalento, entre as pessoas que conheço.'

Ao lado do professor, um amigo dele, o ator Álvaro Gomes, contou que tentou acessar já na quarta-feira o site do Senado para manifestar sua raiva: 'Não consegui porque o site ficou fora do ar. Quando voltou, enviei vários e-mails. Para a Ideli Salvatti, do PT, escrevi: 'Lastimável'.'

O nome do senador petista Aloizio Mercadante, que se absteve na votação, surgiu em todas as conversas. 'No e-mail para ele, eu disse que foi a segunda maior decepção política da minha vida', contou Gomes. 'A primeira? José Dirceu.'

A estudante de Publicidade Carla Rodrigues não fez rodeio: 'Votei no Mercadante e agora acho que fiz bobagem.' Ao lado dela, Samia Nogueira, estudante de Direito, apontou o voto secreto como o causador da 'palhaçada', conforme sua expressão.

Boa parte das pessoas ouvidas associou a absolvição a algum outro fato político. Chacrinha falou da CPMF. O engenheiro Maykow Lenzi lembrou ao repórter o caso dos deputados que, condenados pelo Conselho de Ética no caso do mensalão, foram absolvidos em plenário. O motoboy Moacir Dias, que em 1992 brigou pelo impeachment de Fernando Collor, comentou a volta dele, como senador, por Alagoas.

Na Padaria Santa Marta, na Avenida Heitor Penteado, o balconista conhecido como China lembrou o promotor de Justiça de São Paulo que continuou livre e recebendo salários após ter matado um rapaz: 'Acho que essa gente fica rindo da nossa cara.'