Título: Proporção de pediatras recua de 25% para 7%
Autor: Cimieri, Fabiana
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/09/2007, Vida&, p. A23

Entidades pedem inclusão do especialista no Programa Saúde da Família

Há 30 anos, um em cada quatro médicos recém-formados era pediatra. Hoje, esse porcentual não chega a 7%: os planos de saúde não cobrem as típicas visitas noturnas que caracterizam a especialidade e o Programa Saúde da Família (PSF) não inclui pediatras nas equipes.

¿Não vejo como uma falta de interesse, mas como uma adequação de mercado¿, diz o vice-presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), Eduardo Vaz. Como estão sobrando bolsas de residência em pediatria, a entidade propôs o aumento do período de residência de dois para três anos. Vaz não teme que a medida afaste ainda mais os estudantes: ¿Aqueles que realmente têm a vocação, vão continuar.¿ É o caso de Ana Cláudia Chu, estudante do 3º ano de Medicina. ¿Eu sempre quis ser pediatra, se quisesse enriquecer, faria dermatologia.¿

A Sociedade de Pediatria do Rio de Janeiro, Estado onde um pediatra recém-formado ganha por mês no setor público R$ 1.200 por 24 horas de trabalho semanais, tem promovido fóruns de discussão sobre o assunto. A presidente da entidade, Fátima Coutinho, defende que o Ministério da Saúde inclua pediatras nas equipes do PSF, medida que ajudaria a reverter a desvalorização da atividade. Cada equipe do PSF é formada por um médico, um enfermeiro, um auxiliar de enfermagem e seis agentes comunitários.

¿O que tem acontecido é que muitos recém-formados vão para o PSF porque ganham mais, por volta de R$ 4 mil, mas passam a atuar como clínicos-gerais, e não como pediatras¿, avalia Fátima, acrescentando que também é grande o número de pediatras que acabam seguindo carreira em cargos administrativos.

PACIÊNCIA

Diante do baixo valor pago pelos planos de saúde por consulta (R$ 42), cresce o interesse dos profissionais pela ¿superespecialização¿. Cardiologia pediátrica, neonatologia e neurologia pediátrica estão entre as áreas mais procuradas. ¿Na década de 1980, ainda era raro encontrar um especialista infantil para tratar os casos mais graves, como uma insuficiência renal ou cardíaca, por exemplo¿, diz o neonatologista Sergio Cabral, recém-eleito presidente da Associação Internacional de Pediatria. ¿O especialista tem menos pacientes, e por isso ele pode se dedicar mais a cada caso. O pediatra-geral tem de atender muitas crianças por dia e, quando suspeita de uma doença mais grave, não hesita em encaminhá-la ao especialista. É a lógica dos planos de saúde.¿

Segundo Cabral, muitos pediatras acabam se especializando em fazer tomografias ou ultra-sonografias em crianças. ¿É mais fácil, eles atendem com hora marcada, recebem mais e não têm o desgaste do dia-a-dia que o pediatra-geral tem.¿

O pediatra Paulo Pinheiro, ex-deputado estadual (PT-RJ), lembra com saudades do tempo em que clinicava. ¿Ia à casa das pessoas à noite e paciente meu só ia para emergência em último caso¿, conta. ¿Hoje o médico particular acabou. Qualquer coisa, a criança já é mandada para o hospital, o que acaba aumentando o número de internações¿, avalia.

Para ele, a melhor qualidade do pediatra é a paciência, que anda em falta. ¿Ela foi substituída por exames¿, lamenta.

Para Pinheiro, atualmente, quando suspeita de uma doença mais grave, o pediatra manda logo consultar um superespecialista para tentar chegar a um diagnóstico que poderia ser obtido apenas com a clínica médica.

PESQUISA

Uma pesquisa inédita encomendada pela SBP mostra que um terço das crianças é atendido apenas pelos médicos das emergências.

Quase todas as mães, ou 97% delas, reconhecem a importância do atendimento de rotina. No entanto, apenas 67% das crianças recebem atendimento médico regular. A pesquisa foi realizada com 1.646 mães de crianças de 0 a 10 anos, residentes em 12 capitais do País.