Título: Leite voltou a ser um bom negócio
Autor: Adriana Carranca
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/09/2007, Economia, p. B21

Com a alta dos preços, produtores paulistas retomam investimentos para ampliar a produtividade do rebanho

O produtor paulista de leite Marcelo José de Campos chegou a vender parte do gado e estava prestes a desistir do negócio quando os preços começaram a subir. Em julho, sua fazenda, J. Campos, em Porangaba, na região leiteira de Itapetininga (SP), voltou à produtividade máxima e, em agosto, pela primeira vez, teve todos os custos pagos com o lucro do leite.

'Até o mês passado, eu trabalhava em São Paulo para colocar o dinheiro aqui e vivia da esperança de que os preços iam melhorar. De dois meses para cá, o leite voltou a ser um bom negócio. E já dá lucro', diz Campos, que é dono de uma construtora na capital paulista, mas já pensa em se dedicar totalmente à vida rural. Com 105 vacas, 40 delas em lactação, sua fazenda passou a produzir mil litros de leite por dia, ante 400 litros no início do ano. 'Cheguei a jogar fora o leite, porque o preço era tão baixo que não valia o custo da entrega.'

Apostando no futuro, Campos acaba de contratar uma administradora e um engenheiro agrônomo para ajudá-lo a aumentar ainda mais a produção e reduzir custos. Até abril, o negócio empatava: ele vendia um litro de leite in natura pelos mesmos R$ 0,52 que gastava para produzi-lo. Em junho, seu preço passou para R$ 0,65 e, em julho, deu novo salto, para R$ 0,80. Hoje, ele vende a R$ 0,85, quase 54% mais do que no início do ano, e quer reduzir os custos para R$ 0,45 o litro. Também pretende aumentar a média de produção de leite por vaca, hoje de 21 litros diários. Para isso, está investindo em melhoria genética do gado e melhor aproveitamento da pastagem.

Como Marcelo, a alta no preço do leite motivou outros produtores. Quem não desistiu da atividade comemora os resultados - o maior valor médio mensal desde 1994, segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) . E quem pensava em deixar o setor, voltou a investir.

Agora, eles querem tomar de volta parte do maior mercado do País, São Paulo, com 27,2% do consumo domiciliar. Durante a crise, o Estado deixou de ser o segundo produtor de leite do País (atrás de Minas Gerais), passando para o quinto lugar - foi superado por Goiás, Paraná e Rio Grande do Sul. Mais de 300 municípios reduziram a produção e pelo menos 27 deles abandonaram o setor.

'Os preços despencaram quando o governo liberou a tabela, que antes garantia um patamar mínimo. Ao mesmo tempo, novas leis exigiam mais qualidade do produtor, como transporte em caminhões refrigerados, mas os valores não compensavam os investimentos. Pequenos produtores deixaram o negócio. Hoje, muitos já se preparam para voltar', diz o engenheiro agrônomo e mestre em economia rural Rodolfo Wartto Cyrineu. Segundo ele, porém, é cedo para comemorar. 'O aumento nos preços ainda não recompensou o produtor pelos prejuízos do passado.'

Ele prevê que esses preços se mantenham por, pelo menos, mais seis meses, e que, em seguida, pode haver um ajuste, mas não devem retornar a níveis tão baixos quanto antes. 'Se falta carro no mercado, você coloca os funcionários para fazer hora extra. Mas, se falta leite, não se pode produzir vacas da noite para o dia.' Por isso, o preço do animal deve aumentar no rastro do leite. A saída é melhorar a produção de leite por vaca, reduzir o tempo entre gestações e os custos.

'Enterrei muito dinheiro nessa fazenda', diz o produtor Antonio Carlos de Angelo. O preço baixo do leite fez com que ele optasse por um laticínio, em 1996. O preço do leite processado na fazenda passou de R$ 0,90, em janeiro, para R$ 1,45 este mês. Mas o aumento do preço do alimento in natura dificulta seus negócios, já que ele compra 5 mil dos 7 mil litros necessários, diariamente, para a fabricação de bebidas lácteas, iogurtes, sorvetes e queijos da marca Tony's Milk, vendidos a supermercados, cozinhas industriais e empresas da região.

Seu objetivo é inverter a lógica. Ele já investiu R$ 2 milhões e prevê colocar mais R$ 1 milhão este ano para aumentar a produtividade do rebanho. 'Com margem de lucro de 10%, tenho de ganhar no volume e nos custos. A idéia é depender o mínimo possível de terceiros', diz Angelo, que tem 180 vacas das raças holandesa e jersey, das quais 70 em lactação.

Após uma década de estagnação, ele aumentou a produção para 2.200 litros diários em agosto, ante 1.400 no início do ano. Até janeiro, quer chegar a 3 mil litros e, em 2008, a 4 mil litros. Angelo aposta em tecnologia - usa até um aparelho para detectar o momento exato do cio -, melhoria genética, treinamento de pessoal e otimização da fazenda, que entre outras coisas, aumentou a produtividade da plantação de milho para silagem.