Título: A CNI e o gasto público
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/09/2007, Notas & Informações, p. A3

Animados com a vigorosa atividade industrial, economistas da Confederação Nacional da Indústria (CNI) elevaram de 4,5% para 4,7% a projeção de crescimento econômico neste ano. Um quarto dos segmentos industriais vem se expandindo em ritmo igual ou superior a 10% ao ano e estima-se para todo o setor um aumento de produção de 4,4% em 2007. Mas há riscos à frente, avisam os técnicos, e, para dar maior segurança ao crescimento, o governo deveria moderar seus gastos.

Os números da economia no segundo trimestre, recém-divulgados pelo IBGE, mostram um novo dinamismo em todos os ramos da indústria. Segundo os técnicos da CNI, a liderança novamente assumida pelo setor confere maior robustez ao crescimento do PIB. O setor investe na ampliação e na modernização do parque produtivo e o consumo aparente de máquinas e equipamentos (produção nacional mais importação menos exportação) foi no segundo trimestre 19,5% maior que no período correspondente de 2006. A produção maior em todos os segmentos industriais atende tanto à demanda interna quanto à do mercado internacional. O momento é bom para a economia brasileira, afirmam os autores do Informe Conjuntural da CNI, mas seu otimismo é contrabalançado por uma preocupação. Se a inflação continuar em alta, advertem, a redução dos juros poderá ser interrompida e o crescimento será prejudicado.

Mas não será preciso interromper a trajetória declinante dos juros, argumentam os economistas da CNI, se o governo contiver a expansão de seus gastos. Com uma efetiva disciplina fiscal, os juros poderão continuar em queda, o governo precisará tributar menos e o setor privado terá mais condições para investir e manter a produção em crescimento.

A advertência e o caminho proposto pelos economistas da entidade são os mesmos apresentados, na semana anterior, pelos técnicos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), no editorial de seu boletim trimestral de conjuntura. Não há diferença entre os argumentos: a política fiscal continua a ser fortemente expansionista e o crescimento dos gastos federais é praticamente o dobro da expansão do PIB.

O aumento da despesa governamental tem sido facilitado pelo crescimento da arrecadação de impostos e contribuições - dinheiro gasto muito menos produtivamente do que se ficasse à disposição dos consumidores e das empresas.

A ênfase atribuída pelos economistas da CNI é especialmente digna de atenção. Outros técnicos do setor privado limitam-se a apontar os juros ainda altos e o câmbio valorizado como principais fontes de problemas para o setor produtivo. Os técnicos da confederação vão muito mais fundo na análise e localizam a raiz dos problemas na gastança pública e na voracidade fiscal. E não se trata, segundo eles, apenas do volume de gastos, mas também de sua qualidade, com destaque para a folha de pessoal.

A análise vai além de 2007 e entra em detalhes da proposta de orçamento para o próximo ano. O projeto enviado ao Congresso no final de agosto mantém a tendência expansionista do gasto público e, naturalmente, da arrecadação tributária. Mais uma vez, a despesa federal deverá crescer em 2008 mais velozmente que o valor da produção brasileira. E, mais uma vez, deverá expandir-se a parcela de recursos extraída pelo setor público do setor produtivo da economia.

Essa tendência não se pode manter por tempo indefinido. É uma impossibilidade não só aritmética, mas também física. Mas o governo prefere evitar a tarefa politicamente difícil de podar seus gastos e de reorientá-los em busca de maior eficiência econômica e social. Isso será feito, em algum momento, quando os males de um setor público excessivamente pesado se tornarem intoleráveis. Mas a economia será gravemente prejudicada muito antes disso - e os prejuízos, de fato, já são claramente visíveis para quem não se recusa a contemplar os fatos. O governo festeja um crescimento econômico próximo de 5% e favorecido por um cenário internacional ainda muito bom. Mas esse desempenho é medíocre, quando comparado com o de outros emergentes e com o potencial do País. A diferença é em grande parte explicável pelo tamanho e pela ineficiência do gasto público. Mas o governo insiste em não ver essa evidência.