Título: Batalha judicial põe em risco gasoduto do PAC
Autor: Lima, Kelly
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/10/2007, Economia, p. B10

Petrobrás alerta que briga por terreno na Justiça pode levar ao desabastecimento de gás natural no País

O diretor da Área de Serviços da Petrobrás, Renato Duque, admitiu ontem que há risco de abastecimento de gás natural no País caso o primeiro trecho do Gasene, gasoduto que liga Campinas ao Rio, não seja concluído até o fim deste ano. O trecho está sob batalha judicial e suas obras estão paradas, segundo o diretor. Incluído entre os 183 projetos da Petrobrás do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o duto será responsável por transportar 8,7 milhões de metros cúbicos de gás natural por dia entre Rio e São Paulo. 'Faltam apenas 600 metros. Assim que liberarmos na Justiça, será uma questão de dias para a conclusão da obra e entrada em operação.'

A batalha é travada pela Petrobrás com os proprietários do terreno em que o duto passa em Pirangaí, distrito do município de Resende, divisa dos Estados do Rio e São Paulo. Depois de perder várias vezes na Justiça o direito de construir o duto por dentro da propriedade do advogado e agricultor José Maurício de Barcellos, a estatal teve de desenterrar canos e desviar o curso da obra.

Proprietário da Fazenda Santa Maria há 28 anos, Barcellos afirma que não quer 'um tostão' da Petrobrás. Ele conseguiu impedir na Justiça a passagem do gasoduto, a estatal fez um desvio, depois um fusca estacionado pelo advogado obrigou a empresa a abrir um canal subterrâneo, por baixo do carro.

Novamente, segundo Barcellos, terras do sítio foram perfuradas. 'Você sabia que os futuros donos do gasoduto serão japoneses? No meio do processo, descobri também que tudo isso foi feito sem licitação, por ordem do então ministro (da Casa Civil) José Dirceu. A lei mandava passar por fora da fazenda. Por isso, chamei a polícia, no caso a Agência Nacional de Petróleo (ANP), e ganhei.'

Barcellos afirma que a Petrobrás descumpriu a decisão de fevereiro de 2004, que determinava por onde deveria passar o gasoduto, e tentou passar 'por onde a lei não mandava'. 'Foram derrotados em todas as instâncias e pediram um novo decreto ao presidente da República.' Segundo ele, em agosto de 2005 decisão da 1ª Vara Cível de Resende determinou que os dutos não poderiam passar pelo terreno.

'Depois, a Petrobrás entrou com oito recursos e perdeu todos. Aí, veio o novo decreto do presidente, em julho de 2007, que afronta o meu direito constitucional de posse, propriedade e domicílio.' Com o novo decreto, as obras recomeçaram na frente da fazenda. Por isso ele estacionou o fusca e estendeu várias faixas, uma delas com os dizeres: 'Propriedade de um brasileiro que não se rendeu aos poderosos'.

O gerente-geral de Planejamento e Implantação de Logística e Gás Natural da estatal, Celso Luiz Silva Pereira de Souza, disse que a Petrobrás está recorrendo à Advocacia Geral da União (AGU), pedindo a imissão de posse da área em que passa o gasoduto, entre os dois Estados. 'A Petrobrás já fez o desvio que tinha de fazer, fez acordo com os proprietários da área e não tem de pagar nada a mais do que estava previsto no acordo. Qualquer discussão tem de ser agora em nível federal, já que trata de segurança do abastecimento nacional de gás natural.'

O diretor Renato Duque revelou que a empresa havia feito acordo com os vizinhos de Barcellos, os irmãos Telma e Arnaldo dos Santos, para a desapropriação da área do desvio. 'Fomos agora surpreendidos com uma ação dos proprietários dessa área que pedem na Justiça o dobro do valor que havíamos oferecido pela área.'

Segundo Duque, já foram gastos no desvio da obra o equivalente ao que poderia ter sido pago aos dois proprietários. Orçado inicialmente em US$ 300 milhões, em 2004, esse trecho do Gasene já teve seus custos elevados para R$ 860 milhões.

COLABOROU FELIPE WERNECK