Título: A regulamentação da emenda 29
Autor: Oliveira, Ribamar
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/10/2007, Economia, p. B2

Está na pauta da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, o projeto de lei complementar do senador Tião Viana (PT-AC) que estipula os valores mínimos a serem aplicados em saúde pela União, Estados e municípios e define o que pode ser considerado como ação e serviço público de saúde. A senadora Patrícia Saboya (PSB-CE), relatora do projeto, mudou o texto de Viana e autorizou que os gastos com inativos e pensionistas e com serviços de água e esgoto em cidades de até 50 mil habitantes entrem no cálculo dos recursos mínimos.

Com as alterações feitas pela senadora Patrícia Saboya, o projeto de Viana tem o apoio do líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR). Foi ele que pediu urgência para a votação do texto na CAE. O substitutivo da relatora está também sendo apoiado por governadores, principalmente do Nordeste. Ele poderá entrar em discussão amanhã, na reunião da CAE, depois que outro projeto, que dispõe sobre mudanças na lei de licitações, for votado.

O projeto de Viana é muito semelhante a outro, de autoria do ex-deputado Roberto Gouveia (PT-SP), que tramita na Câmara dos Deputados e está para ser votado desde outubro de 2005. O fato de o governo estimular o projeto de Viana, em vez de acelerar a votação na Câmara da proposta de Gouveia, parece ter, pelo menos, duas explicações.

O projeto de Gouveia é de 2003. Ele já passou por todas as comissões e aguarda ser votado pelo plenário da Câmara. O de Viana surgiu em março e vai percorrer um longo caminho até ser votado pelo plenário do Senado. Poderá receber emendas que atendam aos interesses do governo. Além disso, o lobby da saúde é mais poderoso na Câmara. O governo tentará construir um acordo em torno da regulamentação da emenda 29 durante a tramitação do projeto de Viana. Um dos argumentos usados pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, para a prorrogação da CPMF é justamente a necessidade de definir recursos mínimos para a saúde.

O curioso é que a proposta apresentada por Viana é a mesma de Gouveia no que se refere ao valor mínimo a ser gasto pela União com ações e serviços de saúde: 10% de suas receitas correntes brutas, o que, este ano, daria algo em torno de R$ 66 bilhões. Como os gastos programados para este ano com a área estão estimados em torno de R$ 46 bilhões, o aumento dos recursos seria de R$ 20 bilhões.

Pelos dois projetos, os gastos dos Estados e dos municípios não seriam alterados. Ou seja, os governos estaduais continuariam investindo 12% de suas receitas e as prefeituras, 15%. Foi a senadora Saboya que alterou o conteúdo do projeto de Viana, de tal forma que o substitutivo apresentado ficou bastante diferente do projeto de Gouveia.

A área econômica resiste em fixar em 10% das receitas correntes brutas, os gastos da União em saúde. A saída para o governo pode ter sido encontrada pela senadora Saboya. A relatora manteve o porcentual, mas ampliou as despesas que poderão ser financiadas com essas receitas.

O projeto original de Viana previa que o saneamento de domicílios ou de pequenas comunidades estava entre as ações e serviços públicos de saúde, desde que aprovado pelo Conselho de Saúde do ente da federação financiador da ação. Era o mesmo texto da proposta de Gouveia.

A senadora Patrícia Saboya alterou esse dispositivo. O seu substitutivo determina que os recursos para a saúde financiem o saneamento básico em municípios com até 50 mil habitantes. A rigor, este ano, os recursos orçamentários do Ministério da Saúde já arcam com essa despesa.

A dotação para os serviços urbanos de água e esgoto foi fixada na lei orçamentária em R$ 1,24 bilhão.

Com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o governo adicionou mais R$ 557 milhões para essa finalidade, dentro das dotações do Ministério da Saúde. Assim, o total de recursos previstos para serviços urbanos de água e esgoto passou para R$ 1,79 bilhão este ano.

O substitutivo de Patrícia Saboya inclui entre as ações e serviços públicos de saúde o pagamento de aposentadorias e pensões de servidores da área. Com um detalhe: poderá ser financiada apenas a diferença entre a contribuição previdenciária arrecadada e o gasto com aposentadorias e pensões. Ou seja, apenas o déficit.

A previsão de gasto este ano com aposentadorias e pensões dos servidores do Ministério da Saúde é de R$ 3,6 bilhões. O governo arrecada a contribuição previdenciária dos funcionários e contribui com a sua. Este ano, essa receita ficará em torno de R$ 1 bilhão. Assim, a despesa que seria passível de ser incluída como ação e serviço de saúde é de R$ 2,6 bilhões (R$ 3,6 bilhões menos R$ 1 bilhão).

Se o gasto previsto este ano para saneamento em cidades de até 50 mil habitantes, que está no orçamento do Ministério da Saúde, for somado ao pagamento de inativos e pensionistas, chega-se a cifra de R$ 4,39 bilhões. Os R$ 20 bilhões para as ações e serviços públicos de saúde seriam reduzidos, portanto, nesse valor. Ou seja, os recursos adicionais cairiam para R$ 15,6 bilhões.

De qualquer forma, ainda é uma elevação considerável de gastos. Se o projeto for aprovado, é muito provável que ele entre em vigor de forma escalonada, como já ocorreu com a ampliação de recursos para a área de educação.